A Fundação Bienal lança o primeiro texto curatorial escrito por Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel anunciando o título e o tema da 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível , que acontecerá de setembro a dezembro de 2023 O texto apresenta os principais conceitos e movimentos da próxima Bienal de São Paulo, a maior exposição de arte contemporânea do hemisfério sul e a segunda mais antiga do mundo depois da Bienal de Veneza.
A ideia de formar um grupo com estrutura horizontal sem a figura de um curador-chefe foi sugerida pela equipe de curadores e será central em seu projeto para a 35ª Bienal. Diane Lima é curadora, escritora e pesquisadora independente; Grada Kilomba, artista interdisciplinar, escritora e acadêmica; Hélio Menezes é curador, antropólogo e pesquisador; e Manuel Borja-Villel é investigador, historiador de arte e diretor do Museu Reina Sofia em Madrid. Saiba mais sobre o coletivo curatorial da 35ª Bienal, anunciado em março de 2022, aqui .
Leia o texto curatorial completo abaixo:
coreografias do impossível Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel. Como corpos em movimento podem coreografar o possível, dentro do impossível? A proposta da 35ª Bienal de São Paulo surge como um projeto mútuo em torno de múltiplas possibilidades de coreografar o impossível. Como o título já sugere, é um convite a imaginações radicais sobre o desconhecido, ou mesmo sobre o que figura como impossível/impossível.
Empregamos o termo coreografia para destacar a prática de desenhar sequências de movimentos no tempo e no espaço, gerando múltiplas e novas frações, formas, imagens e possibilidades, apesar de toda a inviabilidade e negação. Interessa-nos os ritmos, as ferramentas, as estratégias e as tecnologias, bem como todos os procedimentos simbólicos, econômicos e jurídicos que os saberes extradisciplinares são capazes de promover, produzindo assim a fuga, a recusa e seus exercícios poéticos.
Aqui apresentamos o impossível indefinidamente, pois compreendemos que sua violência geradora também vai além do que podemos imaginar. Eles são muitas vezes imensuráveis, indescritíveis e inimagináveis. Preocupamo-nos, portanto, em descrever, sem reencenar. E assim começa o ensaio da coreografia. Como proposta curatorial, coreografias do impossível enuncia um espaço de experimentação – aberto às danças do inimaginável – que encarna movimentos capazes de transformar o aparentemente inexistente em existente. Esta ideia de uma coreografia baseia-se na natureza enigmática do facto artístico e, portanto, em tudo o que não está desgastado nem evidente, mas sim no que se pode nomear como segredo, mistério ou como o próprio infinito. São elementos resilientes e, portanto, elementos de ruptura, de tentativa de liberdade, consequentemente.
A equipe curatorial (em ordem alfabética) é composta por Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel. Nossa equipe é um coletivo, atuando horizontalmente, em contra-dança. Para nós, as coreografias começam com nossa prática, cujo princípio é a tentativa de desmantelar hierarquias, procedimentos éticos e normativos que encenam as estruturas verticais de poder, valor e violência dos dispositivos institucionais – que, como todos sabemos, o mundo não mais suporta. Como coreografar as coreografias do impossível ?
Onde estão essas coreografias? Como olhar para eles? E como eles colapsam as categorias estéticas do pensamento moderno, criando uma imagem fractal na qual o político, o histórico, o orgânico, o físico e o espiritual se unem? Quando e como trabalho, frequência, calor, capacidade sonora e matéria passam a fazer parte dessa coreografia? E como criar novos movimentos, alterando a velocidade e as dimensões do tempo: como adiar, acelerar ou mesmo pará-lo?
Este primeiro momento começa como um ensaio, um ensaio de movimentos dedicados a escrever e apagar palavras, termos e conceitos, que produzem uma constelação de pensamentos e ações para encontrá-los. Esse ensaio tem a ver com os gestos de aprofundar, reconhecer, desmoronar e reunir os arcabouços teóricos, as referências simbólicas e os repertórios estéticos que conformam a própria coletividade que somos. E, mais importante, esses gestos ecoam as ressonâncias da coletividade que nos ultrapassa e se expande com os diálogos que temos mantido com outros pensadores, artistas, pesquisadores, ativistas, curadores e poetas.
Entendemos este momento como a primeira coreografia do nosso projeto curatorial. É a singularidade deste ensaio, que vagueia entre fronteiras, que nos permitirá desdobrar as redes da 35ª Bienal de São Paulo de forma extra-disciplinar e extra-institucional. Neste momento, a questão central é: seria possível construir redes que transcendam um movimento espacial expansivo e, inversamente, tendo como ponto de partida os gestos de escuta, de políticas de redistribuição e de cuidado com pessoas, espaços e territórios? , todas elas próprias coreografias do impossível/impossível que habitam os limites institucionais?
Inspirada em percepções não lineares e não progressivas do tempo, a 35ª Bienal de São Paulo propõe também uma reflexão sobre como diferentes registros de temporalidade podem engendrar outros modos de produzir, sentir, expor e se relacionar com as práticas artísticas. Espiral, fractal, tempo(s) dobrado(s); cadências que movem corpos, dilatam e contraem espaços e, portanto, não cabem em cronologias ou sequências. Esse conjunto imensurável de possibilidades de viver o tempo é o cerne de nosso interesse curatorial. Este é o movimento em espiral que propomos, o desenvolvimento do caráter performativo e gradativo dos processos curatoriais e artísticos. Digamos que esta Bienal trata de criar o possível em um mundo regido por impossibilidades. Este é o nosso desenho coreográfico.
Salvador, Berlim, São Paulo, Madri, 2022.
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