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Tunga, a dimensão energética da arte


Uma pungente retrospectiva de Tunga (1952-2016) acontece no Itaú Cultural em estreita colaboração com o Instituto Tomie Ohtake reunindo 300 obras de uma intensa carreira repleta de obras raras e algumas inéditas.

“Tunga, Conjunções Magnéticas” mostra que ocupa os três andares do Itaú Cultural cobre o percurso de um artista consagrado internacionalmente, quatro décadas de produção criativa, concebendo revoluções estéticas e reflexivas inimagináveis, proporcionando amplas leituras com suas esculturas sensíveis mas impactantes no resultado final.

O instigante título da mostra destaca a presença do imã e de metais na sua obra, conjunções magnéticas que delineiam a sua linguagem, elementos que se conectam num envolvimento supremo, confrontando movimentos rítmicos de texturas buscando na tridimensionalidade a ancestralidade dos materiais empregados.

Os desenhos expostos representam os intensos estudos efetuados, esboços e projetos de cada peça criada, tudo pensado e refletido com o intuito de alcançar o equilíbrio exato, um longo processo, vivenciado em cada detalhe.

A mostra não é cronológica, segue os meandros de seus reflexos, suas ligações de trabalhos antigos com os mais recentes, o tempo é único, as experiências anteriores se unem ao frescor do momento, sua obra conecta a energia presente em lances inovadores, essencialmente coeso a simplicidade da forma, captando a energia vital dos metais na alquimia enigmática da natureza.

No Instituto Tomie Ohtake, a incursão pela obra de Tunga prossegue, o visitante poderá apreciar, além de excepcionais desenhos, o antológico filme ÃO, um misterioso túnel em que a entrada e a saída foram eliminados. O destaque no entanto se concentra na obra Gravitação Magnética (1987) realizada com uma série de imãs, fios de ferro e limalha de ferro, que aproximam garrafas, uma antológica proposta, considerada como uma das peças mais emblemáticas de Tunga, que inclusive foi exposta na 19º Bienal de São Paulo (1987), sendo só agora remontada.

Seguindo o rumo do resgate, uma outra obra foi remontada no Itaú Cultural, chama-se Piscina (1975), uma peça considerada perdida. Os materiais utilizados são aço galvanizado, látex, lona, um apito, um boné, uma corrente e uma tela de nylon. Dessa reunião de materiais destoantes surge uma harmonia contrastante, rompe barreiras que tentam limitar voos mais ousados.

Tunga, Piscina (1975)

Em certo aspecto os trabalhos que Tunga se referia como “instaurações”, momentos efêmeros que exigiam a sua presença, estão ausentes obviamente. Tunga tinha grande capacidade de conectar objetos com vínculos referenciais com um fluxo erótico natural. Celebra o sexo nas suas mais diversas formas, como pode se observar nas peças que participaram da exposição From la Voie Humide (2014), inicialmente montada na Galleria Franco Noero, Turim, Itália, unindo os mistérios de sua visão criativa que se diversifica em peças incríveis como as magníficas faianças com lagartos esculpidas em Portugal, produzidas em Bordallo.

La Voie Humide (2014)

La Voie Humide é uma série impressionante, utilizando materiais como terracota, gesso e cristais sustentado por um tripé de bruxo com caldeirões, compondo com fragmentos de corpos a unificação da matéria e do espírito, numa alquimia entre o enxofre e o mercúrio volátil, princípio ativo masculino com o feminino, obra de sua última fase.

Tunga tinha obsessão pela matemática avançada, pela alquimia e pelo xamanismo, lhe proporcionando uma ampla visão das possibilidades da sua elaboração artística, possuía também profundo conhecimento da teoria psicanalítica mas evitava incluir traumas de sua infância no seu labor. Enaltecia o trabalho de Maria Martins (1894-1973) por ter enfocado mitos indígenas, que o impressionaram. Visualizava a união carnal e sensual pela liberação do amor, intelectualmente conectada com o vazio de estômagos e vaginas, túneis infinitos num colapso generalizado. A sua obra permite interpretações das mais variadas, envolvendo a entranhas da terra e do corpo humano numa dimensão erótica sútil a ser descoberta numa forma que ultrapassa as questões da sexualidade.

A sua importância é reconhecida internacionalmente, suas esculturas são sensuais renovando a relação com o espectador, recentemente na Art Basel Miami, todas as suas obras expostas   foram adquiridas, realçando o reconhecimento de suas incursões criativas.

Percorrer os três andares do Itaú Cultural, possibilita ao observador atento vislumbrar a agilidade do artista em abordar questões complexas com resultados plásticos surpreendentes definindo rumos, encontros e confrontos da existência humana nos seus profundos questionamentos, infinitas possibilidades como no vazio de um túnel que concentra os desafios reais e imaginários.


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José Henrique Fabre Rolim

Jornalista, curador, pesquisador, artista plástico e crítico de arte, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisantos (Universidade Católica de Santos), atuou por 15 anos no jornal A Tribuna de Santos na área das visuais, atualmente é presidente da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), colunista do DCI com matérias publicadas em diversos catálogos de arte e publicações como Módulo, Arte Vetrina (Turim-Itália), Arte em São Paulo, Cadernos de Crítica, Nuevas de España, Revista da APCA e Dasartes.

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