Jovem de aproximadamente 16 anos foi encontrada morta nas margens do principal rio da velha Paris, o Sena, próximo ao Museu do Louvre. O corpo não é identificado há 133 anos, mas sua anonimidade entrou para história, e a desconhecida identidade da jovem, tornou-se um ícone da época, entre artistas e burgueses de 1900.
Você conhece este rosto?
Este rosto não é de nenhuma poeta, compositora, ou celebridade, mas é sem dúvidas um rosto que construiu sua popularidade em cima da peculiaridade de sua história. A dona desses belos traços é a L’Inconnue de La Seine (A desconhecida do rio Seine) ou La Vierge Du Canal de l’Ourcq (A virgem do canal de l’Ourcq), uma jovem moça encontrada morta e possivelmente grávida no rio Seine, em 1880. De acordo com a história, o corpo da jovem foi tirado do Rio Seine na altura do Quai Du Louvre em Paris, porém ninguém a identificou, e sua identidade entrou na anonimidade até então.
Segundo rumores, a mulher não era nem francesa, mas havia migrado para Paris. E na mais romântica das cidades, havia se apaixonado loucamente por um rapaz, incapaz de retribuir o sentimento. Naquela época, tão logo a pessoa era declarada morta, colocava-se argila sobre o rosto para tirar o molde, que era usado para fazer uma máscara, capturando a essência do rosto da pessoa morta para a prosperidade. Isso era muito comum na Europa, principalmente em Paris.
Devido a sua identidade desconhecida, a estranha maneira com que morreu e de sua surpreendente beleza, a jovem entrou para a cultura da velha Paris do início do século XX.
Criou-se então, inúmeros boatos e suposições sobre sua identidade e sua morte. Resolvemos investigar a fundo o que está por traz dessa história, e trazer algumas das identidades que a jovem foi ganhando com o tempo.
Depois de seu corpo ser retirado do Rio Sena, a jovem de apenas 16 anos foi levada ao necrotério da cidade. O patologista do necrotério ficou tão encantado com sua beleza e com o seu harmonioso sorriso fixado em sua face, que resolveu tirar um molde de gesso de seu rosto, já sem vida: “Sua beleza era de tirar o fôlego, porém mostrava alguns sinais de aflição no momento da morte. Beleza assim fascinante como tal, deve ser preservada”. Com esta atitude o jovem patologista eternizou um rosto que iria tornar-se moda.
Além de ser dona de traços faciais extremamente harmoniosos, a jovem Virgem do Canal de L’Ourcq trazia em seu rosto um sorriso particular, de extrema serenidade face à morte, expressando um estado de sonho e suspensão. Sendo comparada com o sorriso da Monalisa, a bela jovem impressionou grandemente os artistas da época e toda a sociedade, inspirando diversas obras literárias.
A misteriosa morte da moça fez surgir numerosas especulações a respeito dos motivos de sua expressão estranhamente feliz, e o que esta poderia oferecer de pista sobre sua vida, sua morte e seu lugar na sociedade. Não se sabe ao certo se foi suicídio, assassinato ou um acidente que levou a jovem moça cair nas águas do canal, mas a falta de evidências de violência no corpo, levou-se a crer em suicídio, e, dizia-se, que por razões amorosas.
Mas fora os fatos “técnicos” de sua morte, o que se sabe é que seu rosto se tornou uma tradição: L’inconnue de La Seine, circula por paredes e entradas de casas dos artistas na velha Paris, nas cabeceiras das jovens moças burguesas, em bijuterias, broches e acessórios.Uma imagem que traz uma felicidade misteriosa e um pouco divertida frente à morte, mas também, e sobre tudo, uma figura poética de uma querida e desconhecida jovem na qual qualquer pessoa pode reconhecer uma amada, irmã, amante ou filha.
A popularidade dela também foi de interesse para a história das técnicas artísticas, devido a sua reprodução generalizada. O molde original foi fotografado, e novos moldes foram criados a partir de seu negativo. Estes novos moldes apresentaram detalhes que foram perdidos no primeiro, devido a textura do corpo recém tirado da água.
O critico Al Alvarez escreveu em seu livro, O Deus Selvagem:”me contaram que uma geração inteira de meninas alemãs baseavam seus estilos na jovem do Seine” e ainda cita “a desconhecida do Seine se tornou um simbulo erótico da época, como Bardot foi em 1950. Atrizes alemãs como Elisabeth Bergner se moldaram segundo a Inconnue”. A jovem foi finalmente classificada como um paradigma por Greta Garbo.
A história singular da Desconhecida do Sena iria parar por aí, se alguém não tivesse tido a idéia, nos Estados Unidos, de usar seu rosto para “Rescue Annie”, um modelo muito popular de aprendizado de primeiros socorros (CPR):
Em 1960, o médico austríaco Peter Safar estava aperfeiçoando as técnicas de CPR e procurava por uma forma das pessoas praticarem a rotina. Encontrou um fabricantes de brinquedos norueguês, Asmund Laerdal, que também fazia próteses de plásticos e outros aparatos para treinamento militar.
Safar não precisou de muito para convencer Asmund a trabalhar no projeto, pois seu filho quase havia morrido afogado anteriormente e faria de tudo para que nenhum outro pai passasse pela mesma aflição. Asmund concordou em construir um modelo para que as técnicas fossem praticadas e disseminadas mundo a fora. Mas o boneco precisava de um rosto…
Asmund achou que as pessoas da época poderiam ficar intimidadas em treinar com um rosto masculino, então procurou por rostos femininos. Queria a face de uma morta que fosse, de certa forma, atraente. A face que encontrou estava numa máscara, uma máscara da morte. Foi numa loja de máscaras, junto com replicas de Mozart, Napoleão, Chopin, e outros famosos, que Asmud encontrou o rosto da misteriosa dama do Sena.
Ele não teve dúvidas quando viu uma das milhares copias da máscara da mulher: aquele seria o rosto do primeiro manequim de CPR da história. Deu nome ao manequim, chamaria “RessusciAnnie”. Sua única modificação foi no sorriso, a boca aberta era necessária para a técnica do Dr. Safar.
Em Oddities, série de televisão Americana, ela aparece no epsódio Killer Queen, no programa de rádio online, Radiolab e na música da cantora Emilie Autum, 306º.
Até na música de Michael Jackson, Smooth Criminal, ela aparece como referência a Annie do CPR: “Annie are you Ok?”.
Uma das primeiras fotografias da máscara mortuária da Desconhecida do Sena.
Reprodução da máscara
A Rescue Annie, modelo de treinamento de primeiros socorros
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