Arte Contemporânea

Sutileza na precisão das formas

O arrojo e a inovação caminham na mesma direção promovendo inusitadas experiências e resultados surpreendentes. Recentemente foi aberta a mostra retrospectiva de “Sérvulo Esmeraldo (1929-2017): Linha e Luz” no CCBB, que impressiona o visitante, reunindo 110 obras nas mais variadas dimensões, técnicas e materiais espelhando a notável coerência estética de sua linguagem concisa e sutil.

O requinte de seu traço em cada detalhe permite ao visitante se envolver no percurso de um artista enraizado na vertente geométrica construtiva na atemporalidade de uma poética enaltecedora de desafios constantes, dinamismo arrojado, um visionário em essência. A sua poética é atemporal, permite infinitas leituras envoltas nos impactos dos confrontos estéticos.

Obra da exposição “Sérvulo Esmeraldo (1929-2017): Linha e Luz” no CCBB. Crédito: José Henrique Fabre Rolim

As pinturas, os desenhos, as gravuras, as esculturas, os objetos e os excitáveis comprovam a visão criativa de um grande artista, apaixonado pela precisão matemática, objetivando o equilíbrio estético de cada obra.

O início de seu percurso floresceu no lúdico e paralelamente se envolvia nos estudos dos fenômenos da natureza, apreciava a literatura e a ciência, buscava o conhecimento como meta vivencial. A gravura foi a expressão inicial, precisamente a xilogravura, influência dos livretos de cordéis expostos nas feiras da região do Crato.
Partindo do Ceará, Sérvulo se instala em São Paulo, como estudante de arquitetura, no início da década de 50, na época da realização da I Bienal de São Paulo, um período marcante para a arte. Trabalhou num escritório de engenharia, onde seu interesse pela matemática foi despertado fator essencial para o desenvolvimento de seu trabalho, unindo reflexão e precisão na pureza de uma estética.

Vale notar que a geometria surge na análise das texturas das folhas, dos moluscos e de tantos pormenores que a natureza oferece, estruturas incríveis que estimulam incursões criativas.

Obra da exposição “Sérvulo Esmeraldo (1929-2017): Linha e Luz” no CCBB. Crédito: José Henrique Fabre Rolim

As xilogravuras concebidas nos anos 50, surgem das observações efetuadas nas texturas vegetais, os resultados finais são surpreendentes. A série de xilos foi exposta no MAM de São Paulo, resultando uma concessão de uma bolsa do governo francês, em 1957, na capital francesa ingressou na École Nationale Supérieure des Beaux Arts, uma grande oportunidade no intuito de solidificar a sua carreira.

A sua permanência na França por mais de 20 anos, lhe permitiu desenvolver todas as suas potencialidades, frequentou o meio artístico parisiense, os ateliês de litogravura e calcografia, conheceu Johnny Friedlaender, fez gravuras tendo como referência a obra de Serge Poliakoff. O próprio Poliakoff lhe incumbiu de executar um painel no Hotel Carlton, em Cannes.
Sérvulo Esmeraldo se dedicou com muito empenho em criar objetos tridimensionais e projetos cinéticos, objetos movidos a motores ou outros meios como imãs, eletroimãs e por gravidade. Surgindo daí os Excitáveis, obras movidas a eletricidade estática que reagem ao toque de mão do observador, dando uma nova vertente ao cinetismo nos anos 60.
Na década de 60, surgiram as primeiras esculturas em aço escovado e na década seguinte uma série de esculturas em plexigas. No seu período parisiense teve contato com artistas brasileiros que lá residiam como Sérgio Camargo, Lygia Clark, Rossini Perez e Arthur Luiz Piza, um convívio muito profícuo, além de Júlio Le Parc e Jesus Rafael Soto, expoentes da arte cinética.

Obra da exposição “Sérvulo Esmeraldo (1929-2017): Linha e Luz” no CCBB. Crédito: José Henrique Fabre Rolim

Em 1974, participou da mostra “L´Idée e la Matière” na Galeria Denise René, em Paris. Em 1980, retorna definitivamente a Fortaleza, saudade do clima e da luz do nordeste. Recebeu em 1983, o Prêmio de Melhor Escultor do Ano, pela APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes.

Concebeu trabalhos de arte pública como o Monumento ao Saneamento Básico de Fortaleza (1977-1978) na Pria do Náutico, o Painel da Assembleia Legislativa de Fortaleza e o Monumento Jangadeiro (1992) entre tantos outros destaques.
Em 2021, foi realizada pela Pinakotheke Cultural, uma exposição memorável sobre a sua obra, um excepcional mestre, mas com a atual no CCBB SP, a mais completa já realizada, proporciona uma profunda reflexão.

A sua obra é reconhecida internacionalmente, sua importância no panorama artístico brasileiro é inquestionável, a sua tenacidade e criatividade revelam uma harmonia estética sutil, uma incursão a ser sempre revista e apreciada.

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José Henrique Fabre Rolim

Jornalista, curador, pesquisador, artista plástico e crítico de arte, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisantos (Universidade Católica de Santos), atuou por 15 anos no jornal A Tribuna de Santos na área das visuais, atualmente é presidente da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), colunista do DCI com matérias publicadas em diversos catálogos de arte e publicações como Módulo, Arte Vetrina (Turim-Itália), Arte em São Paulo, Cadernos de Crítica, Nuevas de España, Revista da APCA e Dasartes.

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