Erotic art gerada por FLUX flux-1.1. Prompt: Hyper-realistic erotic fine art photography in the style of Nicolas Winding Refn and Caravaggio, extreme close-up of the face only, shallow depth of field. Beautiful model, dark blonde hair, she exudes the sensuality of Venus de Milo, Wet scene, intense orgasmic facial expression, tense and moaning, eyes partially closed seductively, slanted eyes rolled back in ecstasy, clear shiny sweat, narrow light pink sealed closed lips. smile.
O erotismo sempre desafiou convenções artísticas, mas a chegada da inteligência artificial abriu um novo campo de disputa: quem decide o que é desejável? Se antes o olhar do artista era subjetivo e diverso, agora é o algoritmo que dita padrões de beleza — reproduzindo estereótipos, silenciando corpos e moldando uma estética erótica padronizada.
O erotismo sempre foi a trincheira onde a arte mediu forças com o poder. Das figuras gravadas em vasos gregos às estampas de Utamaro no Japão, a representação do corpo desejante nunca se restringiu ao prazer: era também política, desafio, experimentação. Em cada época, o nu carregou não apenas carne, mas ideias.
No século XIX, Courbet chocou a moral burguesa com a frontalidade de A Origem do Mundo. Já no século XX, Egon Schiele distorceu membros e genitálias em ângulos agudos, expondo a fragilidade do corpo e a brutalidade do desejo.
No Brasil, Tarsila pintou nus tropicais que uniam modernismo e sensualidade, enquanto Wesley Duke Lee, nos anos 1960, levou o erotismo para o terreno das performances e happenings, confrontando a ditadura com corpos livres.
L’Origine du monde (A Origem do Mundo em francês), de 1866, é um quadro pintado pelo realista Gustave Courbet a pedido do diplomata turco otomano Khalil-Bey, que solicitou ao pintor uma pintura que retratasse o nu feminino na sua forma mais crua, por ser colecionador de imagens eróticas.
Mas a partir dos anos 2000, algo mudou: o erotismo entrou no fluxo digital. Primeiro em GIFs e memes, depois em realidades virtuais e deepfakes, até desembocar na inteligência artificial generativa. O corpo deixou de ser apenas representado; passou a ser sintetizado. Já não dependemos de modelos de carne e osso — um prompt bem escrito é suficiente para que a máquina produza corpos ideais, perfeitos, inatingíveis.
Se antes a transgressão erótica vinha do artista que ousava pintar o indizível, hoje a provocação se desloca: não é mais o pincel que desafia, mas o algoritmo que dita. O problema é que, diferentemente do artista, o algoritmo não deseja. Ele estatiza o desejo: busca padrões no oceano de imagens disponíveis e devolve a média, a redundância, o corpo estatisticamente provável.
É nesse ponto que o erotismo se torna algorítmico: o corpo erótico, longe de ser singular, emerge como um catálogo de repetições. Jovem, branco, magro, hipersexualizado — um padrão que ecoa as mesmas fórmulas de revistas masculinas dos anos 1990, mas agora com a autoridade de uma suposta neutralidade tecnológica.
A promessa era de diversidade infinita. Afinal, se a inteligência artificial pode gerar qualquer coisa, por que não corpos múltiplos, desejos insólitos, combinações impensáveis? O que se vê, no entanto, é outra história.
Pesquisadores da University of Washington analisaram milhares de imagens eróticas produzidas por IA em 2024. O resultado foi pouco surpreendente e, ao mesmo tempo, perturbador: mais de 80% das figuras correspondem a mulheres brancas, magras, jovens, com feições eurocêntricas e curvas ajustadas ao molde da indústria pornográfica americana. Não é que a IA seja criativa demais — é que ela não é criativa o bastante.
As bases de treinamento contam a razão. Plataformas como LAION-5B, usadas por modelos generativos como Stable Diffusion, são construídas a partir de bilhões de imagens coletadas da internet. O algoritmo aprende, mas aprende com aquilo que já circula — e o que já circula, no campo erótico, é marcado por décadas de hegemonia ocidental. O corpo negro surge menos como protagonista do desejo e mais como fetiche exótico. Corpos gordos, maduros ou dissidentes aparecem como exceções, quase aberrações estatísticas.
“O algoritmo não cria novos desejos, apenas replica estatísticas de imagens pré-existentes”, resume a pesquisadora Kate Crawford em entrevista à ArtReview. A frase expõe o paradoxo: quanto mais sofisticada a ferramenta, mais ela nos devolve o óbvio.
Na prática, a IA funciona como um espelho ampliado dos preconceitos visuais. Se a pintura clássica europeia já centralizava um ideal branco e masculino de beleza, agora esse viés se expande globalmente com uma velocidade inédita. Em vez de ampliar o repertório do erótico, a máquina o restringe — transformando o desejo em uma fórmula previsível e globalizada.
Esse processo tem efeitos concretos. Artistas que buscam tensionar o erotismo com corpos dissonantes — não binários, racializados, fora do padrão — precisam “lutar” com o prompt. É preciso insistir, repetir, acrescentar descrições quase militantes para que o sistema aceite gerar aquilo que escapa da norma. Mesmo assim, muitas vezes o resultado vem adulterado: se pede uma mulher indígena, o algoritmo devolve uma modelo branca com cocar.
O erotismo algorítmico, portanto, não é apenas estética: é política. Ele define quem merece ser desejado — e quem continua invisível.
Se o algoritmo insiste em repetir corpos iguais, os artistas respondem tentando torcer a máquina. Há quem use prompts como quem escreve poesia — testando combinações improváveis, tensionando a gramática da IA até que surjam corpos que escapem do padrão. O artista digital britânico Jake Elwes, por exemplo, vem subvertendo datasets ao injetar imagens queer e não normativas em treinamentos locais, criando figuras híbridas que desestabilizam o olhar. No Brasil, coletivos como o XOXO exploram o erotismo dissidente em plataformas de difusão, criando corpos trans, ciborgues ou simplesmente grotescos, em um esforço de arrancar da IA aquilo que ela não quer dar.
Mas não é só de arte que se trata. As próprias plataformas têm tentado censurar a produção erótica em IA. Modelos como o DALL·E, da OpenAI, ou o MidJourney, restringem a geração de nudes ou imagens sexualizadas. O motivo alegado é evitar pornografia, mas o efeito colateral é apagar também o erotismo artístico — uma distinção que nunca foi simples. A censura digital repete o velho dilema da história da arte: o que diferencia um nu de Courbet de um conteúdo pornográfico explícito? No espaço algorítmico, essa linha é traçada por filtros automáticos.
Enquanto isso, o mercado observa em silêncio — e em alguns casos, com apetite. Nos últimos dois anos, surgiram colecionadores especializados em erotismo digital, comprando NFTs de imagens geradas por IA que beiram a pornografia artística. Há casos de séries vendidas em leilões online por mais de US$ 50 mil. O argumento é sempre o mesmo: o proibido atrai, e a escassez de imagens eróticas liberadas em plataformas abertas aumenta o valor das que escapam da censura.
A crítica institucional, por sua vez, vacila. Enquanto museus ainda hesitam em exibir imagens eróticas digitais — temendo o escândalo público — algumas galerias menores apostam em mostras híbridas, onde outputs de IA são impressos em grande formato e misturados a fotografias e pinturas. É como se o erotismo digital precisasse vestir a roupa analógica para ser legitimado como arte.
Há, portanto, dois movimentos simultâneos: de um lado, a repetição automática dos estereótipos do desejo; de outro, artistas e colecionadores tentando reabrir brechas no imaginário erótico. O primeiro molda massas, o segundo cultiva exceções. Entre ambos, fica a pergunta: quem tem mais força — o algoritmo que repete ou o artista que resiste?
O Brasil sempre soube lidar com o corpo como campo de disputa. Do modernismo tropicalista às performances dos anos 1970, o erotismo aqui nunca foi apenas sensualidade: foi também crítica, ironia, afirmação política. Adriana Varejão usou a carne pintada como metáfora de colonização e violência; Juliana Notari ergueu em Pernambuco a escultura monumental Diva, um sexo feminino cravado no morro, que dividiu opiniões entre arte e provocação gratuita; Wesley Duke Lee transformou happenings em laboratórios do desejo reprimido sob a ditadura.
Essa tradição torna o Brasil terreno fértil para repensar o erotismo algorítmico. Em um país marcado por diversidade racial e de gênero, mas também por profundas desigualdades, a questão não é apenas estética — é de representatividade. Se a IA tende a invisibilizar corpos fora do padrão eurocêntrico, cabe aos artistas brasileiros tensionar esse apagamento. E alguns já o fazem: coletivos de arte digital em São Paulo e Recife vêm explorando prompts para criar corpos negros, gordos e trans, desafiando a padronização do algoritmo.
A ironia é que, justamente em um país onde o corpo é historicamente central, o erotismo em IA aparece como um novo espelho de desigualdades. Ao gerar figuras femininas com feições europeias, cabelos loiros e pele clara, os modelos ignoram o imaginário afro-brasileiro e indígena que compõe boa parte da cultura erótica nacional. A luta contra essa homogeneização não é apenas artística: é também social.
Do ponto de vista de mercado, o Brasil ainda caminha devagar. Enquanto na Europa e nos Estados Unidos já se vendem séries de erotismo digital em formato NFT, aqui a discussão esbarra em duas barreiras: a censura das plataformas e o preconceito que associa erotismo diretamente à pornografia. Isso cria um campo ambíguo: colecionadores têm interesse, mas hesitam em se expor. O que não impede que pequenas galerias e mostras independentes testem esse território, muitas vezes com obras impressas em fine art — como se fosse preciso fixar no papel aquilo que o digital insiste em borrar.
O resultado é um paradoxo brasileiro: temos a tradição, temos a diversidade e temos a urgência do debate. Falta apenas vencer o receio de que o erotismo algorítmico seja visto apenas como escândalo — e não como um novo capítulo de uma história antiga.
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