Nós do Arte|Ref julgamos importantíssimo o apoio de qualquer tipo – seja por incentivo cultural, divulgação, editais – à artistas novos que estão por ai no mercado, seja comendo pelas bordas ou já com um reconhecimento avantajado. Os novos artistas são fundamentais para a reciclagem do mundo das artes e do mercado, como também para inserção de novos olhares e novos apontamentos. Muito conectados e contemporâneos, os novos artistas ainda trazem aquele carácter experimental tão rico e diverso que artistas já com alguma notoriedade acabam deixando de lado. Esse carácter experimental é o que faz com que novos e interessantes signos surjam no universo artístico. É por esta razão que abrimos esta sessão para que novos artistas – novos mesmo! Muitos formados a pouco mais de 2 anos – possam compartilhar um pouco sobre suas ideias, percursos e trabalhos!
Assim como Ana Druwe e Beba (anteriormente entrevistados) aí vai mais um artista que aposta no hibridismo das artes, na mistura e em novas relações que se pode estabelecer a partir dela.
Conte-nos um pouco sobre sua trajetória nas artes e sua biografia.
Eu nasci em 1987 em São Paulo, dês de muito cedo me interessei por desenho, cinema, e historias em quadrinho, mas até os 16 anos meu maior interesse era se tornar surfista ou skatista profissional, aos 17 comecei a estudar desenho e pintura com a artista Rachel Almeida Magalhães, que tinha estudado na escola Brasil. Resolvi me aprofundar nos estudos em artes e fazer uma faculdade, em 2007 iniciei a faculdade de artes plásticas na FAAP, em 2009 apresentei pela primeira vez um trabalho fora do universo da universidade, no evento de performance Verbo organizado pela Galeria Vermelho. Me formei em 2010, orientado pela Dora Longo Bahia e em 2011 comecei a ser representado pela Galeria Vermelho.
Qual a maior influência ou inspiração para o seu impulso criativo?
Para mim isso muda de tempos em tempos, quase como algo cíclico, eu invento uma desculpa para me dar energia para produzir, depois de um certo tempo deixo de acreditar nessa desculpa, fico deprimido, dai invento outra desculpa, depois de um certo tempo deixo de acreditar nela de novo, e assim por diante.
Mas agora o que está me dando mais energia criativa, é uma teoria da mecânica quântica sobre a criação do universo, que diz, bem resumidamente, que o estado primordial do universo é o vazio, mas um vazio carregado positivamente, e as coisas surgem quando o equilíbrio desse vazio é perturbado, então aquilo que chamamos de criação é uma espécie de erro, um desequilíbrio cósmico, e arte, cultura e toda criação é talvez uma reafirmação desse desequilíbrio, como um erro a partir de um erro, a partir de outro erro… Como se a criação fosse uma espécie de subversão cósmica.
Seu conjunto de obras trazem um certo apelo à memória – lugares, pessoas, espaços, práticas e ícones. Se é possível traçar uma linha de pesquisa no seu trabalho, seria essa? Se não, como você a vê?
Sim, acho que essa e uma das linhas de pesquisa possíveis de se traçar no meu trabalho. Acho que talvez um dos meu maiores objetivos enquanto artista seja evocar o todo o passado e o todo futuro, catalisar tudo no presente, só pra ver se é possível criar outra estrutura de tempo e espaço que seja um pouco mais legal e divertida que essa que nos vivemos.
Seus trabalhos traçam fortes relações com importantes nomes históricos e referências na história da arte, como é o caso de sua performance “Tentativa de evocar o espírito de Joseph Beuyes ao redor deste espaço” ou mesmo sua obra “Auto-retrato com Roosvelt, Lénin e Hittler”. Que relação você estabelece com essas referências especificamente?
No caso da “Tentativa de evocar o espírito de Joseph Beuys ao redor deste espaço” queria criar uma situação um pouco patética de um aprendiz evocando a figura de um mestre que possui um conhecimento superior. O Beuys é uma grande influencia pra mim, tanto pelos trabalhos, como pela sua postura de professor e ativista. Tudo que sei sobre suas ações, é através de fotografias vídeos, e relatos, isso me causa uma nostalgia de algo que não tive a oportunidade de presenciar, quis fazer um trabalho que problematizasse essa isso.
Em “Auto-retrato com Roosvelt, Lénin e Hittler” a figura do aprendiz também está sendo problematizada, quis fazer um “Retrato do Artista quando Jovem” mas ligado com o peso historico dessas três figuras icônicas do século XX. Roosvelt, Lénin e Hittler representam três ideologias que de alguma maneira moldaram o século XX, a minha imagem enquanto “jovem” aparece como um ruído entre essas três.
A figura do artista se apresenta bastante nas suas obras. Há alguma razão específica?
Sim, procuro questionar a figura do artista, pois através dela acredito estar questionando, também, o porque fazemos arte, construímos linguagem e criamos coisas.
Apesar de ter um lado plástico, seu trabalho também é bastante conceitual. Como você, como artista, pensa a relação estabelecida entre público-obra? Esta proximidade – ou distanciamento – influencia em algum momento o seu processo criativo?
Eu não acredito no antagonismo entre estes dois termos, todo pensamento é uma estrutura formal, do mesmo modo que toda estrutura formal é um pensamento. Arte conceitual é um termo datado, pois foi criado quase que em resposta ao formalismo do Clement Greenberg, acho que devemos parar de usar esse termo para classificar ou definir características de trabalhos atuais, ou mesmo para classificar trabalhos que já possuem um distanciamento histórico. Mas a definição desses termos ou a maneira que usamos eles não interfere de imediato na relação entre público e obra.
A proximidade ou o distanciamento entre publico e o circuito de arte contemporânea interfere muito no meu processo criativo. Acho a pergunta muito boa, porque essa relação deve ser mais discutida. As vezes tenho a impressão que quem constitui o que chamamos de publico são apenas pessoas que estão de alguma maneira profissionalmente envolvidas com artes, como se arte contemporânea fosse um circuito fechado aonde apenas os envolvidos conseguem dialogar entre si, e isso muito é limitado. Penso que o circuito de cinema, por exemplo, tem um dialogo muito maior com o publico, possui uma linguagem um pouco mais cognitiva para o mundo atual. É muito frustrante, pensar que arte contemporânea não dialoga com o que está fora do seu campo, e isso me faz pensar em qual seria o papel do artista diante deste problema, acredito que uma solução seria criar um corpo de trabalho que fosse possível existir em diversos, meios, circuitos e linguagens, mas que tivesse uma única matriz, quase que voltando a idéia de Obra de arte total do compositor alemão Richard Wagner. Mas este “problema” é algo a ser discutido por todos envolvidos em arte, instituições, educadores, curadores, e principalmente artistas, as vezes parece que alguns artistas, preferem não discutir isso, ou quando discutem não se colocam como parte do problema.
Está trabalhando em algum projeto específico no momento?
Agora estou trabalhando em um vídeo sobre os Sans-culottes, que era um grupo popular da revolução francesa.
Como você vê o cenário de arte contemporânea para os novos artistas? Existe uma abertura, se sim, na sua opinião, qual?
Eu acredito uma das principais forças que regem o cenário de arte contemporânea hoje são, infelizmente, fatores econômicos. O mercado de arte precisa de jovens artistas, talvez mais do que nunca, do mesmo modo que a economia mundial precisa de um pais emergente, ou alguma promessa de desenvolvimento econômico, o jovem artista é um commodity valioso para o mercado, é aonde se cria espaço para a livre especulação.
Se existe um, qual é o papel do artista na sociedade?
Acredito pode existir vários papeis do artista na sociedade. De fato arte possui um poder político incontestável, cabe o artista e a sociedade decidir como utilizar esse poder. O Nazismo, por exemplo, utilizou muito esse poder a seu favor, se apropriou do conceito de Obra de arte total, que citei anteriormente, ressignificou diversos símbolos, e criou o modelo de totalitarismo mais cruel da historia, foi uma péssima escolha de como e porque utilizar esse poder. A criação de forma tem muito haver com o modo que moldamos e projetamos as sociedades que vivemos ou que gostaríamos de viver. O artista tem total responsabilidade com o que cria, e a sociedade tem total responsabilidade em decidir o que fazer com o que foi criado. O papel do artista na sociedade é simplesmente o de criar formas e estruturas, retrabalhar e criar linguagens, estruturar ou desestruturar símbolos, mas toda problemática vem com o resultado dessa criação.
“Auto-retrato com Roosevelt, Lênin e Hitler” 2009
Da série “Palácio da eternidade e a valsa dos esquecidos” (Uffizi). 2009
Robespierre na tentativa de retomar a Revolução
sendo molestado por um palhaço no atelier from guilherme peters on Vimeo.
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