A Galeria de Arte André apresenta a exposição Segmentos, do artista mineiro Cássio Lázaro. A mostra traz cerca de 50 obras inéditas do escultor, com trabalhos em aço de pequenas e grandes dimensões, incluindo cerca de 25 dos chamados ‘segmentos’ de sua obra que se desdobram em diversos tratamentos do aço como carbono, corten, inox, fosco, espelhado. Destes ‘segmentos’, podem ser destacadas as Rendas, Tiras, Amassados, Corrosões, Derretimento nas bordas, entre outros. A curadoria é de Octávio Guastini.
“A obra escultórica de Cássio Lázaro é de uma riqueza extraordinária de formas, cores, ritmos, texturas e ideias. As configurações das partes de suas obras variam da geometria às formas orgânicas, resultantes de procedimentos tais como o corte e a dobra, a amassadura, a torção, a fragmentação, a construção”, afirma Enock Sacramento, crítico e curador de arte, responsável pelo texto de abertura da exposição.
O artista nasceu em Cássia, em Minas Gerais, em 1952, cidade que deu origem ao seu nome. De família muito humilde, sexto filho de 13 irmãos, Cássio saiu de casa muito cedo. Aos nove anos foi trabalhar numa olaria, onde começou a se interessar pelo barro e iniciou suas primeiras brincadeiras com a escultura, modelando bonecos de barro. Com 14 anos foi para São Paulo, onde trabalhou num banco até conseguir uma bolsa para estudar na Escola Panamericana de Arte. Iniciou suas obras escultóricas com arame, passou para materiais coletados e reciclados e seguiu para o aço.
Nos anos 1970, expôs na Bienal de Arte de São Paulo, com figuras sinuosas e com um nó de 2,20 metros de altura feito em inox. Em 1977, foi trabalhar numa fundição, onde aprendeu todos os processos do bronze, ferro e aço. Em seu atelier, desenvolveu maquinário de grande porte para moldar e tecer suas obras em material de difícil arregimentação como o aço.
O esmero na execução, o domínio entre a força e a delicadeza, a constante pesquisa formal aproximam a obra de Cássio daquela de grandes artistas da escultura, isto não só numa proximidade nos resultados obtidos, mas na fraternidade velada dos processos, na busca constante pela obra ideal, sua pedra filosofal.
Paulo Klein – crítico e curador de artes visuais
Depois de anos trabalhando numa linha de fragmentos em bronze, o artista iniciou o que chamou de “desenfreado processo de criatividade”, produzindo trabalhos abstratos em chapa de aço. Lembrou-se dos tempos em que era motoboy no banco, com os papéis amassados jogados no lixo. Criou, a partir daí, a série “Amassados”, em chapa de aço.
“Desta vez eu não tinha nenhuma preocupação em representar figuras, já sentia e reconhecia a força da arte. Percebi que o exercício de observação da natureza e de tudo que está ao nosso redor nos fornecem todas as formas, basta saber representá-las plasticamente. Passei a olhar com mais cuidado para as erosões do solo, os estufamentos das pinturas se rompendo pela umidade, as sombras se projetando, etc. Assim foram nascendo as Rupturas, as Rasgaduras, as Explosões, as Rendas… Eu estava livre para criar e tinha confiança e compreensão do que estava fazendo. A criatividade tornou-se infinita”.
O artista autodidata afirma que sua experiência aconteceu na prática, já que não teve acesso a informações teóricas. “Meu caminho foi longo e minhas experiências foram consistentes e intensas, por isso posso afirmar a importância do escultor executar a própria obra, sempre que tiver condições para isso. O fazer nos conduz a inúmeras possibilidades de criação, pois até quando erramos, aprendemos com o erro. Ao acompanhar todo o processo do meu trabalho, vou transformando as sobras, as rebarbas, os respingos e vejo nascer novas composições, tornando infinitas as criações… “.
O crítico Enock Sacramento segue ainda em seu texto afirmando que “Muitas de suas esculturas relacionam-se com elementos da natureza, ações, conceitos, noções abstratas. É por isso que a maioria delas recebe títulos como Corais, Afluente, Borras, Colunas, Torres, Amassados, Fragmentação, Expansão, Tensão cinética… Na série Afluentes, por exemplo, em meio a áreas de configuração textural ou de reentrâncias, destaca-se uma área lisa que percebemos como um rio. Nas esculturas desta pequena série, acontece o milagre da transformação do metal em água. Algumas lembram corais, outras, resíduos resultantes da ebulição ou infusão, chamas, cortes longitudinais de troncos. Nenhuma copia a realidade circundante. Com efeito, o artista não reproduz a realidade. Ele cria uma outra realidade que é sua obra escultórica”.
Uma das galerias de arte mais tradicionais da cidade de São Paulo, a Galeria de Arte André completa 60 anos em 2019 como a maior galeria de arte da América Latina e anuncia a fusão de suas sedes e acervos. Atualmente dirigida por Juliana Blau, a casa fundada em 1959 pelo romeno André Blau (1930-2018) ajudou a forjar o mercado de arte no Brasil e passou por diversos endereços até se consolidar na Rua Estados Unidos, entre a Avenida Rebouças e a Alameda Gabriel Monteiro da Silva.
Referência no mercado de arte brasileira, há décadas a Galeria de Arte André acolhe gerações de artistas e incentiva o surgimento de colecionadores e amantes das artes. Conhecida pelo seu acervo de esculturas e obras de artistas como Di Cavalcanti, Candido Portinari, Alfredo Volpi, Aldemir Martins, Manabu Mabe, Hector Carybé, Roberto Burle Marx, entre muitos outros, a casa oferece ao público exposições periódicas e projetos educacionais e culturais.
Para celebrar seu aniversário de 60 anos, a galeria realiza quatro exposições ao longo de 2019. Dentre elas, duas são coletivas — a primeira e a última do ano — com curadoria assinada pelo crítico de arte Mario Gioia, reconhecido no Brasil e exterior.
A primeira delas é a mostra coletiva Entre Artes e Ofícios, Centros e Arrabaldes, com abertura em 23 de abril, que reúne trabalhos de diversas gerações de artistas do Grupo Santa Helena e de nipo-brasileiros.
Em junho, acontece a exposição individual de Sônia Menna Barreto, artista apresentada ao mercado pela Galeria de Arte André. A terceira mostra, por sua vez, é realizada em setembro e traz obras do artista Cássio Lázaro. Finalmente, em novembro, o encerramento das comemorações se dá por meio de uma mostra coletiva histórica e pelo lançamento do livro que conta a história da galeria.