Museu da Fotografia Fortaleza traz Irmãos Vargas e Martín Chambi

Por Gabriel Magno - maio 31, 2019
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O Museu da Fotografia Fortaleza (MFF) inaugura no dia 1º de junho a exposição que marca o encontro histórico de três dos maiores nomes da fotografia peruana. Carlos e Miguel Vargas Zaconet e Martín Chambi estarão juntos em Estúdio de Arte Irmãos Vargas encontra Martín Chambi, mostra inédita no Brasil.

Com curadoria de Diógenes Moura, são exibidos mais de 100 fotografias destes artistas e de suas referências. Todas as obras fazem parte da Coleção Paula e Silvio Frota, que reúne o maior acervo da América Latina sobre os Irmãos Vargas. Na ocasião da abertura, o curador vai conduzir uma visita guiada, seguida pelo monólogo Existência. Imagem. Abandono.

No fim do século XIX e início do século XX, as cidades de Lima, Cuzco e Arequipa foram responsáveis pelo desenvolvimento artístico do Peru. E este período teve grande significado para a história da fotografia na América Latina, diretamente ligada ao trabalho de Chambi e dos Irmãos Vargas. Foi ainda nos anos 1920 que Arequipa teve um crescimento econômico latente por consequência de altos investimentos em infraestrutura e comércio na região, o que fomentou as exportações de lã e mineração na cidade. Assim, o poder aquisitivo da população aumentou e os estúdios fotográficos multiplicaram-se para atender à nova burguesia.

Todas em preto e branco, as imagens que compõem a mostra foram realizadas entre 1912 e 1941. O conjunto delas propõe um discurso amoroso no qual o registro poético é uma constante, o que torna cada uma delas uma espécie de realidade perfeita, tempo preciso, calmaria. Segundo o curador, Diógenes Moura, Estúdio de Arte Irmãos Vargas encontra Martín Chambi é um verdadeiro tesouro, é como um segredo que aos poucos vai revelando histórias de um povo que viveu no início do século XX. Ver os Irmãos Vargas ao lado de Martín Chambi é quase uma solenidade, imbuída pelo silêncio e pela elegância de uma época passada, o que nos levará para sempre ao futuro.

Sobre os Irmãos Vargas 

Nascidos em 1885 e 1887, respectivamente, na cidade de Arequipa, os irmãos fotógrafos Carlos e Miguel Vargas Zaconet participaram de uma época de ouro da fotografia peruana. Em 1900, ainda no colégio, Carlos e Miguel fabricaram sua primeira máquina fotográfica, o que chamou a atenção do fotógrafo Máximo T. Vargas (apesar do sobrenome, Max não possuía relação familiar com Miguel e Carlos). Os irmãos passaram, então, a trabalhar em seu estúdio de fotografia. Em 1912, os irmãos Vargas abriram seu próprio estúdio em Arequipa, local da primeira exposição com fotografias feitas em papel de nitrato, em 1913. Dois anos depois, conseguiram sua primeira mostra internacional coletiva, em São Francisco, Estados Unidos. Na década de 1920, o estúdio dos irmãos Vargas recebia todos os tipos de artistas: poetas, escritores, dançarinos e atores. Embalados pela expansão e pelas correntes culturais da região (grupo Orkopata, em Puno, e Indigenistas, em Cuzco), Carlos e Miguel transformaram o estúdio em um centro de difusão cultural onde essas personalidades eram fotografadas e participavam de atividades intelectuais como debates, saraus, conferências e recitais. Entretanto, a Grande Depressão de 1929 impactou, também, a economia peruana, o que acabou com parte da ousadia do estúdio. Adaptado à nova realidade, na qual a fotografia deixava progressivamente de ser um serviço de luxo, o espaço se tornou mais moderno, comercial e barato. O “Estúdio de Arte Vargas Hnos” (“Hnos”, uma abreviatura de “hermanos”) fechou em 1958, deixando recordações dos anos de glória da sociedade arequipenha.

Sobre Martín Chambi 

Depois de trabalhar como aprendiz de Max T. Vargas durante nove anos, Chambi montou o próprio estúdio em Sicuani. Seus primeiros cartões-postais foram publicados nesse mesmo ano, 1917. Em 1923, abriu em Cuzco um novo estúdio, fotografando tanto os compatriotas indígenas quanto as figuras importantes da sociedade. A partir daí, fez frequentes viagens pelos Andes, onde capturou imagens impressionantes de ruínas incas, bem como a cor local das paisagens desoladas e seus habitantes. Ele conseguiu mesclar a tradição europeia, próxima da pintura, com os retratos em estúdio. Em suas fotografias de viagem, Chambi lançou um olhar antropológico e simultaneamente terno sobre o lado mais esquecido do país – aquele habitado pelos povos de origem pré-colombiana. O uso da luz natural e seu sentido de composição engrandecem as imagens e os personagens retratados. O olhar do fotógrafo tem uma espécie de frescor pós-colonial, que impõe profundidade, magia e personalidade aos retratos de pessoas, paisagens e monumentos arqueológicos imersos na vastidão solitária dos Andes. Chambi se transformou no fotógrafo símbolo do povo de língua quechua, dando voz à estranha melancolia do homem andino. Muitas das fotografias de Chambi permaneceram desconhecidas até sua morte, em 1973. Algumas delas ainda esperam pesquisas mais aprofundadas para virem à luz.

Sobre Diógenes Moura 

É escritor, editor e curador de fotografia independente. Em 2013 realizou a curadoria/edição das mostras “Busca-me”, de Boris Kossoy (Galeria Berenice Arvani) e “A Construção de um Olhar – Fotografia Brasileira no Acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo”, no Centro León Jimenes, na República Dominicana. Publicou o livro “São Paulo de Todas as Sombras”, edição que reúne fotografias (Lucia Guanaes/ Marc Dumas) e contos/polaroides urbanas de sua autoria. Entre 1998 e maio de 2013 foi curador de fotografia da Pinacoteca do Estado de São Paulo onde realizou exposições, reflexões sobre o pensamento fotográfico e possibilitou o reconhecimento do acervo do museu como um dos mais importantes da América Latina. Foi eleito o Melhor Curador de Fotografia do Brasil pelo Sixpix/Fotosite, em 2009. No ano seguinte recebeu o prêmio APCA – Associação Paulista dos Críticos de Arte de melhor livro de contos/crônicas com “Ficção interrompida – uma caixa de curtas” (Ateliê Editorial). Com o mesmo título foi finalista do Prêmio Jabuti de Literatura 2011. Em 2012 foi curador de mostras importantes como “Andy Warhol – Superfície” (Museu da Imagem e do Som São Paulo), “Interior Profundo – Mestre Júlio Santos” (Pinacoteca do Estado de São Paulo) e “Dos Filhos Desse Solo”, exposição que representou o Brasil no Photoimagem 2012 e que recebeu o grande Prêmio da Crítica pela Associacion Dominicana de Críticos de Arte, INC. Escreveu o livro de crônicas fotográficas “Fulana despedaçou os versos”, que teve lançamento em 2014. Diógenes só entende fotografia vendo-a como literatura.

Sobre o Museu 

Inaugurado dia 10 de março de 2017 com a coleção Paula e Silvio Frota, o MFF recebe cerca de 4 mil visitantes por mês, que podem conferir dois andares de acervo fixo, além de mais outro que recebe exposições temporárias. Compreendendo sua função social para além do espaço expositivo, os projetos Museu na Comunidade e Museu no Interior já visitaram diversas comunidades da capital e do interior (Maracanaú, Jericoacoara e Redenção), levando até o público em situação de vulnerabilidade, teoria e prática acerca do mundo da fotografia. Além disso, o equipamento realiza uma série de ações que têm como objetivo a divulgação de novos talentos e a promoção da fotografia contemporânea a partir da realização de cursos e visitas guiadas para a terceira idade e de oficinas e workshops voltados a artistas, estudantes e educadores – resultado, inclusive, da proximidade da instituição junto às Secretarias de Cultura (Secult), de Turismo (Setur) e de Educação do Estado (Seduc), e às Secretarias Municipais da Educação (SME), de Turismo (Setfor) e de Cultura de Fortaleza (Secultfor). O MFF tem também uma equipe de educativo formada pelos alunos dos cursos de Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade de Fortaleza (Unifor), Pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), Artes Visuais do Instituto Federal do Ceará (IFCE), da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Estácio e Escolas Técnicas do Governo do Estado. Para promover a inclusão e a acessibilidade o Museu disponibiliza a leitura de QR Code por meio de dispositivos móveis, para que deficientes visuais possam ouvir conteúdo descritivo referente às obras em exposição.

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