A Galeria Estação apresenta a primeira individual do artista Rafael Pereira. Com visitação até 20 de janeiro de 2024, a mostra tem curadoria de Tiago Sant’Ana e reúne 20 óleos sobre tela, majoritariamente retratos, mas também naturezas mortas e paisagens que remetem a personagens conhecidos pelo artista em lugares distintos, como Novo Airão, no Amazonas, Ouro Preto e Teófilo Otoni, em Minas Gerais, Pontal do Paraná, no sul do país, e Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo, onde atualmente reside.
Talento emergente, com uma produção de retratos personalíssimos que remetem ao figurativismo de caráter social da pintura modernista, Rafael Pereira é apresentado ao público paulistano por meio de um balanço condensado na exposição Rafael Pereira – Lapidar Imagens, que será aberta ao público em 13 de novembro.
“Morei em alguns lugares do Brasil e comecei a pintar em 2008. Em 2013, resolvi sair de São Paulo e fazer a minha primeira viagem, que intitulei na época de ‘viagem artística’. Peguei minha mala de tintas e parti para uma cidade ainda desconhecida por mim, Ouro Preto, em Minas Gerais. Sempre que viajei para morar em outras cidades fui também em busca da minha pintura. Sempre absorvi o jeito que as pessoas vivem, a cultura de cada lugar, suas cores, sua flora e fauna, elementos que fizeram com que eu pudesse construir este emaranhado de imagens e vivências para preencher o que chamo de memórias”, explica Pereira.
Para o curador da exposição, esse mosaico de espaços geográficos, capaz de desencadear afetos e percepções representados pelo artista, sobretudo se desdobra em traços caraterísticos da identidade autoral de Pereira, algo que, para Sant’Ana, fica evidente na generosidade com que ele retrata seus personagens.
“O trabalho do Rafael tem uma especificidade que é fazer do singelo, da cena cotidiana, algo poético que ao mesmo tempo tem elegância e sofisticação. Isso fica bem explícito, por exemplo, na maneira com que ele compõe as roupas dos personagens bem como na altivez das pessoas retratadas, dando um olhar dignificante a elas”, defende.
O título da mostra, Lapidar Imagens, faz alusão ao fato de o artista ter trabalhado como lapidador de pedras preciosas durante o período em que residiu em Teófilo Otoni. Para o curador, o ofício aprendido na cidade do nordeste de Minas Gerais também influenciou o gestual de Rafael Pereira.
“A experiência com o fazer da lapidação se reflete no esmero do gesto artístico, na medida em que Rafael se debruça na elaboração de minúcias, presentes especialmente em estamparias de roupa, fundos de paisagens ou na construção de espécies de ornamentos em volta ou em uma posição lateral às pessoas retratadas”, defende.
Para o artista, as investigações e reflexões desenvolvidas ao longo de dez meses com o curador evidenciaram fatores que foram decisivos para a percepção de coesão autoral dos trabalhos que ele tem criado ao longo dos últimos 15 anos.
“O fato de sempre retratar as pessoas de forma simples e digna é um dos fatores que formam a unidade nas obras que irão compor essa mostra. Outro ponto é a construção de ambientes e elementos que apresento nesse conjunto de trabalhos, todos ligados às minhas vivências e memórias afetivas. A paisagem rural que faz parte do meu cotidiano, os objetos pelos quais guardo boas memórias, como o violão, personagens que me remetem a pessoas conhecidas e até mesmo familiares. Tudo isso reforça a unidade que busco em minha pintura”, conclui Pereira, que dedica a exposição a sua mãe, Maria do Carmo Alves Jardim, e à memória do seu pai, Dilson Pereira Ramalho.
Para Vilma Eid, sócia-fundadora da Galeria Estação que teve contato com a obra de Pereira por meio da artista visual Germana Monte-Mór e do colecionador Edmar Pinto Costa, a decisão de representar o artista foi algo irrecusável.
“Percebi em Rafael um talento natural que deveria ser incentivado e exibido. Sempre gostei de dar a oportunidade para que jovens como ele possam se expressar. No final de 2021, começamos a comprar seus trabalhos para nosso acervo com o objetivo de oferecer ao público a primeira exposição do Rafael, que agora apresentamos com curadoria do artista plástico e curador Tiago Sant’Ana”, contextualiza.
Nascido em São Paulo capital, em 1986, mudou-se para Teófilo Otoni (MG) com a família ainda criança e foi lá que se especializou no trabalho com as pedras preciosas. De volta a São Paulo, aos 17 anos, Rafael se revezava entre o trabalho para pagar as contas e a prática da pintura e do desenho, atividades que foi desenvolvendo de maneira autodidata, experimentando com tinta a óleo, nanquim e giz pastel.
Aos 24 anos, decidiu se dedicar exclusivamente à profissão de artista, vendendo seu trabalho nas ruas das diversas cidades onde morou Brasil afora. As vivências pessoais guiam a pesquisa de Rafael Pereira e formam o repertório imagético de sua obra. Sua ancestralidade de matriz africana dita muito do ritmo estético de seu trabalho, com suas simbologias e cores vivas. O processo de criação inicia-se justamente a partir do emprego das cores na tela, que aos poucos vão decodificando as figuras mentais e os sentimentos relacionados até se transformarem na composição.
Desde as primeiras produções de Rafael Pereira, então incentivadas pelo casal de colecionadores Claudete Guitar e Torquato Saboia Pessoa, até as mais recentes, pode-se identificar muito da sua própria história. A série de pinturas Catadores de Cana (2021), por exemplo, trata da realidade dos cortadores de cana, resgatando não apenas a profissão de seu pai, mas também o que provavelmente tenha causado sua morte. O retrato tem sido uma categoria bastante trabalhada pelo artista, por meio de representações de pessoas que passam por sua vida, e em seu ambiente familiar. Essas figuras, que geralmente olham profundamente quem as observam, povoam a imaginação do artista. Outra importante prática de sua pesquisa é a xilogravura. De forma autodidata e com a ajuda de outros artistas, Rafael utilizou inicialmente referências do modernismo brasileiro para investigar a fundo os processos da técnica, bem como seus materiais e ferramentas. Artistas como Cândido Portinari, Ismael Nery, Lasar Segall, Tarsila do Amaral, inspiram os cenários, traços e temas em suas obras.
Com um acervo entre os pioneiros e mais importantes do país, a Galeria Estação, inaugurada no final de 2004 por Vilma Eid e Roberto Eid Philipp, consagrou-se por revelar e promover a produção de arte brasileira não-erudita. A sua atuação foi decisiva pela inclusão dessa linguagem no circuito artístico contemporâneo ao editar publicações e realizar exposições individuais e coletivas sob o olhar dos principais curadores e críticos do país. O elenco, que passou a ocupar espaço na mídia especializada, vem conquistando ainda a cena internacional ao participar, entre outras, das exposições Histoire de Voir, na Fondation Cartier pour l’Art Contemporain, na França, em 2012, e da Bienal Entre dois Mares – São Paulo | Valencia, na Espanha, em 2007. Emblemática desse desempenho internacional foi a mostra individual de Veio – Cícero Alves dos Santos, em Veneza, paralelamente à Bienal de Artes, em 2013.
No Brasil, além de individuais e de integrar coletivas prestigiadas, os artistas da galeria têm suas obras em acervos de importantes colecionadores e de instituições de grande prestígio e reconhecimento, como a Pinacoteca do Estado de São Paulo, o Museu de Arte de São Paulo, o Museu Afro Brasil (SP), o Pavilhão das Culturas Brasileiras (SP), o Instituto Itaú Cultural (SP), o SESC São Paulo, o MAM- Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e o MAR, na capital fluminense.
Rafael Pereira – Lapidar Imagens
Quando: de 13/11 a 20/1/2024
Onde: Galeria Estação
Endereço: Rua Ferreira Araújo, 625 – Pinheiros, São Paulo
Vernissage: 13/11 (segunda-feira), das 18h às 21h
Horários de funcionamento da galeria: Segunda a sexta, das 11h às 19h; sábados, das 11h às 15h; não abre aos domingos
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