O Museu Judaico de São Paulo apresenta, a partir do dia 5 de abril, a exposição “Boris Lurie – Arte, Luto e Sobrevivência”. O museu traz a primeira exibição do artista Boris Lurie (1924-2008) no Brasil, dando sequência a uma série de exposições realizadas pela Europa, Estados Unidos e América Latina.
O que fazer com o luto, a raiva, a dor, o inconformismo? Com grande parte de sua família executada pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, Boris Lurie passou a vida dedicado à construção de uma obra plástica irrequieta e inquietante.
Com curadoria de Felipe Chaimovich e desenvolvida com apoio da Fundação Boris Lurie, “Boris Lurie – Arte, Luto e Sobrevivência” percorre o legado do artista por meio de 44 colagens, desenhos, pinturas e esculturas pautados pela memória dos acontecimentos e atravessados por um forte componente erótico, às vezes sadomasoquista.
Nascido em Leningrado, Rússia, no ano de 1924, Boris viveu sua infância e adolescência em Riga, Letônia. Em 1941, sua mãe, a avó materna, a irmã caçula e sua primeira namorada foram assassinadas após a prisão num campo de evacuação. Lurie e seu pai, por sua vez, passaram pelos campos de trabalho de Lenta e Salaspils e pelos campos de concentração de Stutthof e Buchenwald-Magdeburg e sobreviveram à Shoah. Libertos em 1945, emigraram para os Estados Unidos.
Foi em Nova York, para onde emigrou com ajuda de uma irmã mais velha, que Lurie iniciou a formação artística que lhe permitiria dar novas formas à memória. Esse processo se faz sentir, por exemplo, em “O Retrato de minha mãe antes do fuzilamento”, de 1947, uma evocação da figura materna e obra-chave em seu percurso de luto/criação. A partir dela, a figura da mulher se torna permanente em sua obra, assim como a estrela de Davi amarela – elemento que marcava pessoas judias durante o regime nazista e que o artista continuou a usar na sua roupa após emigrar para os Estados Unidos.
“Boris Lurie produziu quadros e objetos com a estrela amarela, inclusive usando peças de roupa íntima, como cuecas e corseletes”, escreve o curador, assinalando a indissociabilidade entre morte e desejo na obra do artista. “Negando-se a esquecer, sua indumentária continuava a testemunhar uma sobrevida impacificável”, complementa Chaimovich.
Frequentador da escola de arte nova-iorquina Art Students League e tendo convivido com pintores gestuais como o francês Pierre Soulages, Lurie baseou-se na linguagem publicitária e na mass mídia norte-americana para trabalhar suas “pin-ups”. A partir de 1955, produziu colagens críticas à objetificação do corpo feminino e, em 1960, fundou No!art, um movimento contra os valores da sociedade de consumo da época criado junto com Sam Goodman e Stanley Fisher. De volta a Riga em 1975, pela primeira vez desde a Segunda Guerra, deu início à redação de um diário de viagem, que, juntamente com uma novela de ficção, foram publicados postumamente.
“Um artista que sobreviveu não porque sustentado pela arte, mas por causa dela”, sugere Felipe Arruda, Diretor Executivo do Museu Judaico. “Um artista que confrontou e reelaborou por toda a vida as imagens do horror presenciado, que vocalizou em seus trabalhos o protesto contra o antissemitismo, que manipulou signos do sexo, da propaganda, do consumo, do poder e da morte para construir uma obra crítica e sem esquiva, às vezes perturbadora.”
Fruto de uma iniciativa da sociedade civil acalentada por quase duas décadas, o Museu Judaico de São Paulo (MUJ) abre suas portas visando cultivar as diversas expressões, histórias, memórias, tradições e valores da cultura judaica, em diálogo com o contexto brasileiro, com o tempo presente e com as aspirações de seus diferentes públicos.
Amparado por um programa cultural e participativo que entrelaça a experiência judaica à cultura brasileira e à arte contemporânea, o MUJ nasce comprometido com a coexistência entre os variados grupos sociais e identidades, com o combate à intolerância e ao preconceito, com a educação e a transmissão intergeracional, valores a um só tempo universais e judaicos.
Instalado em um edifício tombado pelo patrimônio municipal e guardião do maior acervo judaico do país, constituído integralmente por doações, o MUJ considera a memória como fenômeno vivo, fonte de resistência e sobrevivência, em permanente transformação.
Que esta casa possa ser templo de inspiração e fórum de debate, lugar de encontro entre identidade e alteridade, espaço que conecta histórias e cria tranças entre um passado, um presente e um futuro partilhados coletivamente.
Exposição “Boris Lurie – Arte, Luto e Sobrevivência
Curadoria: Felipe Chaimovich
Período expositivo: de 5 de abril a 9 de julho
Local: Museu Judaico de São Paulo. Rua Martinho Prado, 128 – São Paulo, SP
Funcionamento: Terça a domingo, das 10 horas às 19 horas (última entrada às 18 horas)
Ingresso: R$ 20 inteira; R$10 meia
Classificação indicativa: Livre
Acesso para pessoas com mobilidade reduzida
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