O Sesc São Paulo, unidade Ipiranga, abre a mostra retrospectiva da obra de Eustáquio Neves, artista mineiro descendente de pessoas negras escravizadas. A exposição atravessa quase 40 anos de produção e carrega em si uma história extensa de diásporas e resistências. “É um trabalho que capta e manipula imagens ligadas às relações étnico-raciais promovidas no passado e no presente, como a violência contra os corpos, a intolerância contra os ritos e a privação de direitos da população negra”, destaca o curador da mostra, Eder Chiodetto.
“Outros Navios: Fotografias de Eustáquio Neves” está subdividida em três salas, e obras pontuais distribuídas pela unidade do Sesc Ipiranga. Na sala 1, encontram-se séries que aludem às violências e silenciamentos perpetrados contra pessoas escravizadas. Na sala 2, localizam-se séries que tematizam a resistência por meio de saberes ancestrais e rituais afro-brasileiros, bem como exibição de suportes diversos utilizados por Eustáquio Neves em seu processo de criação. Por fim, a sala 3 exibe uma videoinstalação, criada a partir do material bruto de três vídeos do artista Post No Bill (Nigéria, 2009 – 2022); Bariga (Nigéria, 2009 – 2022) e Crispim: Encomendador de Almas, (Brasil, 2006 – 2022).
A mostra traz cópias de filmes fotográficos, negativos, acetatos, matrizes, esboços, estudos de paleta de cor e texturas utilizados nos experimentos do artista no laboratório analógico de seu ateliê. Suas investigações incluem ainda desenhos, grafias, carimbos, recortes de documentos, jornais, colagens, entre outros. “A fotografia experimental no Brasil converge para a obra de Eustáquio Neves. Ele é um dos pioneiros em criar imbricações de linguagens da fotografia com pintura, textos e abrasões que visam gerar metáforas visuais sobre como as histórias oficiais são geradas em camadas simbólicas. Em seu laboratório, ele descama verdades impostas e nos revela labirintos por meio dos quais pontos de vistas sorrateiramente apagados vêm à tona”, comenta o curador.
José Eustáquio Neves de Paula (Juatuba, MG, 1955), é fotógrafo e artista visual. Constrói suas obras por meio de processos de experimentação com a linguagem da fotografia, utilizando camadas de sobreposições de imagens e procedimentos químicos. Suas narrativas discutem a sociedade e o lugar histórico da população negra como protagonista de suas práticas culturais, conferindo ao artista destaque dentro e fora do país. Forma-se em 1979 como técnico de química industrial, e, em 1984, encerra sua atuação na indústria e se debruça no estudo integral da fotografia de forma autodidata. Seu conhecimento dos processos químicos lhe possibilita uma amplitude na manipulação e nos resultados das imagens. É no laboratório de revelação e de ampliação que Eustáquio Neves interfere manualmente nos negativos das fotografias, gerando diversos efeitos. Atua como freelancer nas áreas de documentação e publicidade, ainda em 1984, e abre um pequeno estúdio fotográfico em Belo Horizonte, em 1987. Na década de 1990, ganha destaque no cenário nacional da fotografia, trazendo questões sociais, étnicas e culturais, que surgem da experiência proporcionada pela visitação à exposição Registros da Minha Passagem Sobre a Terra, do artista Arthur Bispo do Rosário (1909-1989), no Museu de Arte da Pampulha (MAP), em 1989.
Entre 1994 e 1995, desenvolve a série Arturos, sobre um agrupamento familiar no município de Contagem, em Minas Gerais, caracterizado por ações de continuidade e respeito ao sagrado baseadas no sincretismo da religião católica com as religiões de matriz africana, em ocasião da comemoração da Festa de Nossa Senhora do Rosário, santa protetora de irmandades negras no Brasil colonial. Ainda em 1995, ganha o Prêmio Marc Ferrez de Fotografia no Rio de Janeiro. Destaca-se no ano de 1996 com a participação na Coleção Pirelli/Museu de Arte de São Paulo (Masp) de Fotografias. Participa da 6ª Bienal de Havana, em Cuba, em 1997, que descentraliza os grandes circuitos mundiais de exposições e abre espaço para artistas caribenhos e da América Latina. Ganha o Prêmio Nacional de Fotografia do Ministério da Cultura e Funarte, no Rio de Janeiro, no mesmo ano, e o Prêmio Especial Porto de Seguro de Fotografia, em São Paulo, em 2004. No ano seguinte publica seu primeiro livro, Fotoportátil, editado por Eder Chiodetto.
Eustáquio Neves segue sua produção discutindo a diáspora negra no Brasil, enquanto rememora e recria as histórias dessa descendência africana com base em aspectos que constituem seu cotidiano, enfatizando o Brasil como o país que tem a maior população negra fora da África, e no qual o racismo estrutural é realidade.
Com 75 anos de atuação, o Sesc – Serviço Social do Comércio conta com uma rede de 45 unidades operacionais no estado de São Paulo e desenvolve ações com o objetivo de promover bem-estar e qualidade de vida aos trabalhadores do comércio, serviços, turismo e para toda a sociedade. Mantido pelos empresários do setor, o Sesc é uma entidade privada que atua nas dimensões físico-esportiva, meio ambiente, saúde, odontologia, turismo social, artes, alimentação e segurança alimentar, inclusão, diversidade e cidadania. As iniciativas da instituição partem das perspectivas cultural e educativa voltadas para todas as faixas etárias, com o objetivo de contribuir para experiências mais duradouras e significativas. São atendidas nas unidades do estado de São Paulo cerca de 30 milhões de pessoas por ano. Hoje, aproximadamente 50 organizações nacionais e internacionais do campo das artes, esportes, cultura, saúde, meio ambiente, turismo, serviço social e direitos humanos contam com representantes do Sesc São Paulo em suas instâncias consultivas e deliberativas. Mais informações: clique aqui.
Exposição: Outros Navios: Fotografias de Eustáquio Neves.
Abertura: Terça-feira, dia 6 de setembro. às 16h30.
Visitação: Quarta-feira, dia 7 de setembro até 26 de fevereiro de 2023.
Sesc Ipiranga: Rua Bom Pastor, 822, Ipiranga, São Paulo – 04203-001
Horários: Terça a sexta, das 9h às 21h30. Sábado, das 10h às 21h30. Domingo e feriado, das 10h às 18h.
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