Exposições e Eventos

Transparências vivenciais da arte em mostras atuais

A força da arte é imensurável, coaduna uma infinidade de valores universais que consagra o ser humano na sua máxima aptidão, enobrecendo as reflexões e os resultados alcançados, permitindo avanços consideráveis por estimular a visão aprimorada da atemporalidade da criatividade.

A verdadeira arte extrapola as regras restritivas de uma sociedade, questiona tudo, confronta os meios de comunicação, polemiza e desestabiliza as certezas das castas dominantes, percorre os constantes desafios impostos pelos sistemas massacrantes e cruéis de um mundo cada vez mais complexo e desagregador.

No panorama das mostras atuais que ocorrem na cidade, algumas convergem em revisões oportunas, outras se aprofundam em questões extremamente importantes como problemas sociais, meio ambiente, identidade de gênero, lutas antirracistas, entre tantos outros itens que surgem a cada instante, sem falar do retrocesso generalizado e da censura que ameaça a todos.

No MAM – Museu de Arte Moderna, acontece o 36.º Panorama de Arte Brasileira com o tema Sertão que aborda justamente a instigante situação do país, com todo o seu potencial de transformação na busca de liberdade de expressão, no respeito às diferenças, ao meio ambiente e a tantas outras questões que afligem a sociedade em todas as suas nuances.

As obras expostas dialogam com o momento atual magistralmente, compondo um painel da nossa realidade com um vigor de certa forma lúdico. Dentre os artistas que se destacam Vania Medeiros e Antonio Obá traçam paralelismos contundentes que fazem o espectador assimilar as vicissitudes de uma época densa.

Por outro lado, no Instituto Tomie Ohtake, Daniel Senise apresenta uma instalação bem impactante, medindo 5m x 3,66m, formada por material recuperado do Teatro Villa-Lobos, no Rio de Janeiro, destruído pelas chamas de um incêndio que ocorreu em 2011, mas que continua interditado e abandonado.

Outras imagens atraem a atenção do público como as fotografias do Hospital Matarazzo, um galpão abandonado da Estrada de Ferro Sorocabana, além de locações na Bahia e em Nova York. Interessante observar que tais fotos servem de suporte para suas pinturas e intervenções com materiais e objetos resgatados desses locais registrados pelas lentes da câmera. A mostra é extremamente marcante pela grandiosidade das peças como pela dramaticidade dos lugares representados que refletem destruição e abandono.

Recentemente, o Instituto Tomie Ohtake lançou uma importante publicação “AI-5 50 Anos Ainda não terminou de acabar”, que completa a exposição homônima realizada ano passado, que inclusive foi premiada pela APCA. A mostra curada por Paulo Miyada, é uma das mais significativas dos últimos tempos por resgatar aspectos históricos de um período ditatorial militar, que tolheu a liberdade de expressão e perseguiu intelectuais, artistas, cientistas, jornalistas entre tantos outros profissionais.

Uma publicação bem atual alertando para os perigos de um retrocesso institucional com consequências nefastas para o país.

No Masp, a mostra Histórias das Mulheres: Artistas antes de 1900, tem como proposta recolocar a obra de artistas europeias, americanas, africanas e latinas que desenvolveram o seu ofício do século XVI ao XIX, cobrindo assim nomes esquecidos que refletem propostas com resultados surpreendentes como no caso da austríaca Maria Verelst, Artemisa Gentileschi, Sofonisba Anguissola e latino-americanas, como Magadalena Mira Mena.

No mesmo Masp, se encontra uma outra exposição que permite uma visão panorâmica sobre a produção de artistas atuantes do século XXI, “Histórias Feministas: Artistas depois de 2000” enfoca aspectos variados do olhar feminino nos quatro cantos do mundo. Destacam-se Virginia de Medeiros, Rosa Luz, Aline Motta, Ana Mazzei, Katia Sepúlveda, Mônica Ventura e Lys Parayzo com mostra na Verve Galeria.

Paralelamente, numa sala especial Anna Maria Maiolino apresenta nove instalações de períodos diversos, dos anos 70, com a ditadura ameaçando os bem pensantes passando para os anos 2000, onde floresce temas relacionados à migração, um cunho memorialístico bem fundamentado e extremamente pungente.

A Galeria Verve, que participa pela primeira vez da ArtRio, apresenta em seu acolhedor espaço expositivo, duas individuais que fazem uma reflexão sobre alguns aspectos importantes do momento atual.

“Quem tem medo de Lyz Parayzo” é o sugestivo título da exposição de Lyz, formada por obras que envolvem o visitante, com a série Bixinhas, Alcinhas e Escudos, fazendo uma incursão pela sua vivencia com histórias da comunidade LBGTQ+ passando também pelo concretismo e neoconcretismo brasileiro, acoplando raízes profundas com artistas do quilate de Waldemar Cordeiro e Lygia Clark, além do lendário Max Bill, que com a sua “Unidade Tripartida” exposta na I Bienal de São Paulo, em 1951, no Pavilhão do Trianon em plena Avenida Paulista, estimulou renovações marcantes no panorama artístico brasileiro.

Lyz Parayzo – Bixinha

A outra individual em cartaz na Verve é “Sex Shock” de Élle de Bernardini, formada por 12 trabalhos que fazem uma leitura pessoal sobre os chamados corpos dissidentes, transexuais, propondo um aprofundamento sobre o universo do gênero nos seus mais variados ângulos, propondo análises oportunas.

Élle de Bernardini – Sex Shock

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José Henrique Fabre Rolim

Jornalista, curador, pesquisador, artista plástico e crítico de arte, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisantos (Universidade Católica de Santos), atuou por 15 anos no jornal A Tribuna de Santos na área das visuais, atualmente é presidente da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), colunista do DCI com matérias publicadas em diversos catálogos de arte e publicações como Módulo, Arte Vetrina (Turim-Itália), Arte em São Paulo, Cadernos de Crítica, Nuevas de España, Revista da APCA e Dasartes.

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