Vinte e dois anos mais novo que RUBENS1, independente e criativo, Antoon van Dyck, conhecido também por Sir Anthony VAN DYCK (1599-1641) já estava registrado por volta de 1618, como pintor de retratos, na Guilda de Saint Luke2, na Antuérpia.
“Anthony van Dyck foi essa raridade entre pintores, um menino-prodígio. Antes dos vinte anos”, já se tornara um dos mais importantes e preferidos da oficina de Rubens. (JANSON, 1992, p. 523).
Por volta de 1620, ainda no estúdio de Rubens, van Dyck viajou para a Inglaterra. Ali conheceu famosos colecionadores, ligados à corte, para os quais pintou e com os quais teve a oportunidade de ver as obras de TICIANO3 e VERONESE4, que o marcaram definitivamente, na dissolução das linhas com o ambiente de fundo e na aplicação das cores e tons venezianos. No final de 1621 foi para a Itália, onde permaneceu por seis anos, estudando os mestres italianos e pintando para a aristocracia romana e genovesa, desenvolvendo um estilo de retrato de corpo inteiro.
De volta para a Antuérpia, criterioso, com grande clientela e extremamente produtivo, van Dyck desenvolveu e renovou a técnica de representação de retratos refinados e aristocráticos, combinando o que tinha visto em Ticiano, Veronese e Rubens.
Em Haia, por volta de 1631-1632, van Dyck trabalhou para o Príncipe de Orange5 e seus descendentes. No mesmo ano, em Londres, na Inglaterra foi nomeado pintor da corte de Carlos I6 e sua esposa, a rainha Henrietta Maria, passando a receber um salário anual.
Os inúmeros retratos do rei e da rainha, bem como de membros de sua corte, influenciaram profundamente a percepção da história aristocrática durante o reinado de Carlos I e tornaram van Dyck um dos artistas mais requisitados na alta sociedade inglesa.
De acordo com Gombrich (2000) a esse artista de temperamento de prolongada tristeza, se deve o registro artístico da conduta desafiadora da elite social e o culto às maneiras e refinamento cortesão.
Os cabelos compridos, as enormes mangas bufantes, os sapatos forrados de veludo com salto alto, os tecidos de seda, damasco e cetim, as botas altas com as bordas viradas, os chapéus enfeitados, as meias de seda até a altura das calças abaixo dos joelhos, o arremate dos laços de fita, as grandes golas de renda caindo nos ombros, enfim, a moda do século XVII, assim como a elegância das poses aristocráticas, são apresentadas nas pinturas de van Dyck.
Até 1641, van Dyck transitou entre a Inglaterra e a Antuérpia, aumentando seu status artístico e social principalmente após a morte de Rubens. De tal forma que sua oficina de pintura compreendia, tal como a do antigo mestre, uma quantidade imensa de assistentes para dar conta das encomendas.
Gravemente doente, van Dyck voltou definitivamente para o lado da esposa e do filho recém-nascido, na Inglaterra, vindo a falecer logo depois.
Sejam nos retratos palacianos, nos temas religiosos ou mitológicos, van Dick soube, assim como Rubens, simbolizar o movimento do Barroco, nas composições em grande escala, na livre distribuição dos elementos no plano visual dentro da estrutura aberta, que excede os limites do quadro e leva o observador a fazer parte do tema e do cenário.
Van Dyck representa James Stuart, amigo de Carlos I, com a pose e indiferença típicas da nobreza. O retrato provavelmente foi executado para comemorar a investidura na Ordem da Liga, a mais elevada de Inglaterra sobre o cavalheirismo, recebido por James Stuart em 1633. A medalha recebida está presa no lenço de seda verde, embaixo do colarinho de renda, um acessório da época. O galgo carinhosamente encostado nos quadris é símbolo da lealdade e também representa o nobre passatempo das caçadas, comum no período.
A técnica de jogar os tons semelhantes e sequenciais na direita e esquerda, ora escura, ora brilhante, lembram muito o mestre Rubens.
Antoon van Dyck:
“criou uma nova tradição do retrato aristocrático que perdurou na Inglaterra até aos finais do século XVIII e teve uma influência considerável também no continente.” (JANSON, 1992, p. 525)
Pintura executada em 1641, na ocasião do casamento do Willem II (1626-1650), principe de Orange, com quinze anos, e a filha de Carlos I (1600-1649) a princesa Maria Henrietta Stuart (1631-1660) perto de completar dez anos.
A joia no peito de Maria foi um presente do príncipe, que veste um traje entregue por um alfaiate de Londres. A espada de ouro teria sido entregue por Carlos I. Provavelmente, Van Dyck já com a saúde debilitada iniciou o retrato durante a curta permanência do casal na Inglaterra, logo após a cerimônia do casamento.
Van Dyck soube como nenhum outro artista mostrar o estilo barroco palaciano, onde de acordo com Hauser (2003) a nobreza se reveste dos conceitos de moralidade romântico-cavaleiresca. Heroísmo e fidelidade, moderação e equilíbrio, generosidade e delicadeza são as virtudes que o nobre deve procurar e se orgulhar, pois fazem parte do mundo harmonioso e belo, que o rei e sua corte apresentam aos demais.
BAYERISCHE STAATSGEMÄLDESAMMLUNGEN – ALTE PINAKOTHEK,Munique, Alemanha. Disponível em: https://www.sammlung.pinakothek.de/en/bookmark/artwork/5RGQeJapGz Acesso em 02 nov. 2019.
GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 2000. 714 p.
HAUSER, Arnold. História Social da Arte e da Literatura. Tradução Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 1032 p.
JANSON H. W. História da Arte. Tradução: J.A. Ferreira de Almeida; Maria Manuela Rocheta Santos. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992. 823 p.
RIJKSMUSEUM, Amsterdam, Holanda. Disponível em: URL: http://hdl.handle.net/10934/RM0001.COLLECT.8289 Acesso em: 23 set. 2019.
THE CLEVELAND MUSEUM OF ART, Cleveland, EUA. Disponível em: http://www.clevelandart.org/art/1923.1100 Acesso em: 01 out. 2019.
THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART, Nova York, EUA. Disponível em: https://www.metmuseum.org/art/collection/search/436252 Acesso em: 23 set. 2019.
1 Na obra Barroca do artista flamengo, Peter Paul RUBENS (1577-1640), as alegorias, os episódios bíblicos, as cenas mitológicas, os eventos históricos, os retratos e as paisagens se destacam vivas e atuais, nas telas gigantescas. Famoso, no seu estúdio na Antuérpia, foram treinados inúmeros artistas.
2 Uma das mais importantes guildas formadas nos Países Baixos, a Guilda de Saint Luke foi fundada em Antuérpia no final do século XIV. A guilda representava diferentes atividades e o governo regulava o comércio, investindo no mestre, que se responsabilizava pelos aprendizes e pela venda das pinturas e gravuras ali produzidas. A guilda também protegia os membros contra as importações, controlando o mercado de arte, forjando conexões com autoridades cívicas e outras guildas.
3 Grande retratista, procurado por toda corte europeia, ricos e famosos, TICIANO Vecellio di Gregorio (1488/90-1576) conhecido, também, por Tiziano Vecellio é, talvez, o representante supremo da pintura veneziana. Com uma obra versátil, abrangendo temas religiosos, mitológicos e paisagísticos, com a aplicação de tons quentes e frios e do chiaroscuro. A dissolução das linhas com o ambiente de fundo influenciou os futuros artistas.
4 Maneirista, Paolo VERONESE (1528-1588) dominou a pintura veneziana ao lado do colega TINTORETTO (1518-1594) após a morte de Ticiano. O artista ficou conhecido pelas cenas de banquetes e costumes da vida opulenta dos palácios venezianos. A aplicação de cores fortes e os tons puros e luminosos marcaram a sua obra.
5 Frederico Henrique de Orange-Nassau (1584-1647) príncipe de Orange.
6 Rei da Inglaterra, Escócia e Irlanda, Carlos I (1600-1649) foi coroado em 1626 e morreu enforcado em 1649. Casado com Henrietta Maria (1609-1669) filha do rei Henrique IV (1553-1610) da França e Maria de Médici (1575-1642)
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Toda forma de arte é surpreendente.