A escuridão de Mustafa Sabbagh (+18)
O artista Mustafa Sabbagh é fotógrafo mas seu trabalho traz diversas outras conexões, como por exemplo com a moda, a dança, o sexo e a performance. Nascido na Jordânia no ano de 1961, formou-se em arquitetura pela Universidade de Veneza e não saiu mais da Itália. Mustafa, enquanto fazia trabalhos como modelo, conheceu Richard Avedon e foi esta sua influência para o início de sua carreira como fotógrafo, ficando conhecido através de seus trabalhos com a “Vogue Itália”.
Entramos em contato com ele e conseguimos uma entrevista exclusiva, a qual será transcrita abaixo.
Arte Ref: Como e quando você descobriu que seu interesse ia além da arquitetura?
Mustafa Sabbagh: Arquitetura não é nada mais que um modo de habitar espaços, assim como nós habitamos a roupa em nosso corpo.”Talvez, o mais profundo desejo de cada artista é de confundir ou fundir todas as artes, assim como as coisas se fundem na vida real.”(Man Ray). Deste modo, meu trabalho segue um caminho pela fotografia focando na minha mais profunda necessidade de investigação psicológica, não diria que meu desejo vai além da arquitetura, mas sim que ela anda pela mesma via: o planejamento, comum a ambos os campos, sendo consciente de que o contexto sempre cria a substância.
AR: Você acredita que seu trabalho dialoga com a Performance Arte?
MS: Definitivamente. No meu trabalho, assim como eu o concebo, todo ato criativo é um ato performático; ou seja, os dois ao mesmo tempo. Primeiro, começa com uma dança entre o fotografo e o fotografado, depois, entre o fotografo e o espectador. Uma real performance dupla, a qual –apesar ser o autor do roteiro- muitas vezes não é concedido ao autor qual será o fim deste roteiro. “Se você ama e junto a isto você usa a destreza e perspicácia das suas conexões; quando a precisão de cada um dos seus gestos é perfeita, tudo isto colabora para que você encontre os seus pés( molhados em espuma). O resultado disto não será a sua dança mas as suas conexões“ Genet, sempre…
Obras em Destaque
AR: As pessoas em suas fotos são modelos ou performers?
MS: São cúmplices.
AR: Nós vimos que você acredita na pele como o vestido mais bonito. Você se vê como um estilista?
MS: Sim, também, à medida em que eu estou interessado na roupa não só como o objeto em si, mas como um instrumento; Não só pela maneira como vestimos aquilo, mas principalmente a relação ao porque você está vestindo aquilo. E este é o motivo de de ter a pele como vestido preferido: porque ela reflete autenticidade. E autenticidade está sempre despida.
AR: Qual o tipo de reação que você espera das pessoas que vêm o seu trabalho?
MS: De um modo geral, quase como uma atitude e provavelmente uma auto defesa, eu não tenho nenhuma pretensão de esperar algo de ninguém, assim como também não tenho a pretensão de agradar ninguém. Eu fotografo, sempre sendo consciente do fato de que, em minhas composições, eu projeto o lado mais obscuro existente dentro de mim. Portanto, o que mais me acalma é saber que sou capaz de mover o espectador a uma reflexão… mas, atualmente, eu ficaria feliz apenas em levar este a alguma dúvida.
AR: Você acredita que seu trabalho já possa ter sido confundido com pornografia?
MS: O principal pra mim é que ele é uma boa pornografia! Dar razões para excitação não é nada menos que satisfatório, não é mesmo?
AR: Como você vê o uso do corpo na arte contemporânea?
MS: O meio é a mensagem, como disse McLuhan; no meu caso, a mensagem não é só o click, mas também o corpo. Portanto, como um meio de comunicação, o corpo deve ter o dom da síntese, e síntese é a exaltação da autenticidade, inerente ao indivíduo que a tem. Me incomoda quando a mensagem é deturpada…
AR: As pessoas fotografadas por você tem liberdade para escolher as posições ou é apenas você quem controla elas?
MS: Em minhas fotos, as pessoas dançam. No ritmo de minha musica, mas de acordo com suas irredutíveis expressões.
AR: Você acredita em algum padrão estético de beleza?
MS: Eu evito a idéia de um único padrão de beleza, ao mesmo tempo em que desprezo a homogeneização, o mais aberrante e nojento mecanismo social que pode existir. Mas eu sei com certeza o que é a feirua: é aquilo que nos faz clones. E é a mídia o mais preocupante criador da estética. Feirua é anular a ideia de que cada indivíduo é uma pessoa, porque “amor e arte não se tratam do que é bonito, mas sim do que, graças a elas, se tornam bonito” (Karl Kraus).
AR: Você nasceu na Jordânia, um dos territórios palestinos. O que tem a dizer sobre o conflito palestino-israelense?
MS: A mídia está apresentando a história como um conflito irreconciliável entre duas partes iguais, mas não é tão simples assim. Ataques de extremistas palestinos contra civis inocentes não são justificáveis, e o anti-semitismo do Hamas é simplesmente nojento, isso é claro; mas estes extremistas ganham legitimidade pelo fato de lutarem contra uma grotesca opressão que ocorre há décadas por parte de Israel. No momento em que Israel ocupa, coloniza, bombardeia e ataca uma nação livre, legalmente reconhecida pelas Nações Unidas, interferindo em sua água, seus comércios, suas fronteiras… Criou a maior prisão a céu aberto no mundo, cruelmente e de forma horrível isolando-a imediatamente após. Agora, enquanto as bombas caem, as famílias literalmente não têm como escapar. Nós estamos falando sobre crimes de guerra que nós não aceitaríamos em qualquer outro lugar; por que nós deveríamos desviar os olhos da Palestina? Meio século atrás, Israel e seus vizinhos árabes entraram nesta guerra, e Israel ocupou à força a faixa oeste e Gaza; ocupações frequentemente se seguem a conflitos, mas nenhuma ocupação militar deveria se tornar uma tirania por décadas a fio, encorajando e favorecendo somente extremistas que usam o terror para atingir os civis. E quem está sofrendo? Famílias, de ambos os lados, que estão apenas buscando e discutindo por liberdade e paz.
Para conhecer mais do trabalho de Mustafa, acesse seu site ou confira suas imagens em seu tumblr.