Opinião

Revisões radicais na arte

A releitura de certos movimentos artísticos e suas respectivas épocas representam a descoberta de várias conexões com a atualidade, a arte permite sempre infinitas interpretações que viabilizam novas propostas além de reflexões sempre oportunas.

A impactante mostra “Mulheres Radicais: Arte Latino-americana, 1960-1985” na Pinacoteca, reúne todas as características de um período revolucionário, que definiu novos rumos, contestando valores consagrados e criando parâmetros sensíveis às transformações sociais e culturais do século XX.

Abraham Palatnik

A exposição foi organizada pelo Hammer Museum, em Los Angeles, tendo viajado no início do ano para o Brooklyn Museum, em Nova York. A curadoria da venezuelana Cecilia Fajardo-Hill e da argentina Andre Giunta realizou uma pesquisa profunda durante vários anos pelo nosso continente, reunindo obras de 120 artistas de quinze países.

O enfoque da mostra é o envolvimento reflexivo dessas artistas que se posicionaram politicamente lutando pelos seus direitos em diversos países latino americanos em que a repressão era marcante.

Hélio Oiticica

Foram selecionadas artistas de extrema importância como as brasileiras Lygia Pape, Lygia Clark, Ana Bella Geiger, Ana Maria Maiolino, Regina Vater, Regina Silveira, Amélia Toledo, Vera Chaves Barcellos, Wanda Pimentel, Letícia Parente, Marcia X, Celeida Tostes, Claudia Andujar, Josely Carvalho, Iole de Freitas, Lenora de Barros, Carmela Gross entre algumas que redefiniram os rumos da arte contemporânea.

Mulheres radicais na pinacoteca

A exposição foi estruturada por temas, separadas por nove seções que enfocam aspectos essenciais da linha mestra central que é o corpo político. Os tópicos são bem definidos: autorretrato, paisagem do corpo, performance do corpo, mapeando o corpo, resistência e medo, o poder das palavras, feminismos, lugares sociais e o erótico.

A mostra deve ser apreciada detalhadamente, por resgatar obras marcantes de artistas latino americanas e de latinas que moram no Estados Unidos, um mapeamento surpreendente, com uma montagem impecável, além de ser acompanhada de um formidável catálogo, referência para futuras abordagens e pesquisas.

Seguindo a linha revisionista, o Instituto Tomie Ohtake abriu a exposição “AI-5 50 anos – Ainda não terminou de acabar”, que faz um incursão por um período bem tenebroso da história recente brasileira com curadoria de Paulo Miyada. Dividida em setores como censura, criminalização da opinião e reflexões sobre a crise das instituições, a mostra realça o ato institucional que ampliou os poderes do presidente num período ditatorial bem contundente com reflexos em todos os segmentos da sociedade atingindo a atividade artística. Preciosos documentos e obras de artistas como Claudia Andujar, Regina Silveira, Bruno Dunley, Paulo Brusky, Regina Vater, Sergio Sister, Helio Oiticica, Cybele Varela, Claudio Tozzi, Carlos Vergara, Gabriel Borba, Carlos Zilio, Cildo Meireles, Nelson Leirner, Vlademir Dias-Pino entre tantos outros completam um painel esclarecedor daqueles anos de chumbo. Um resgate bem oportuno demonstrando os grandes malefícios que uma ditadura promove, notadamente o cerceamento da liberdade de expressão. O esforço para a realização dessa mostra é notável, o ITO se empenhou profundamente para conseguir reunir um material de grande relevância histórica e artística comparável a outra antológica mostra, “Histórias Afro-Atlânticas” realizada em parceria com o MASP, duas mostras de cunho revisionista extremamente significativas para o atual panorama brasileiro.

Paulo Bruscky AI-5 50 Anos

Na linha da releitura, o Sesc Pompeia apresenta a mostra Arte-Veículo reunindo mais de 200 obras, divididas em sete núcleos, concebidas nos últimos 60 anos por 47 artistas como Cildo Meireles, Eduardo Coutinho, Antonio Manuel, Paulo Bruscky, Marcia X, Jac Leirner, Hudinilson Jr., Artur Barrio, Leonilson, e grupos como 3Nós3, Manga Rosa, abordando especificamente a exploração da mídia brasileira como campo de intervenção artística. A apropriação de veículos de comunicação como suporte de difusão de trabalhos dos mais variados cria uma possibilidade incrível de comunicação atingindo um público bem amplo proporcionando inusitadas reações.

Paulo Bruscky AI-5 50anos

Por outro lado, o Sesc Pinheiros acolhe uma instigante mostra “O Outro Trans-Atlântico” concebida pelo Museu de Arte Moderna de Varsóvia, que faz uma incursão pela arte cinética e ótica na América Latina e no Leste Europeu, entre os anos 60 e 70, reunindo obras de Julio Le Parc, Lothar Charoux, Ivan Serpa, Sérvulo Esmeraldo, Abraham Palatnik, Almir Mavignier, Jesus Rafael Soto, Victor Vasarely, Sergio Camargo, Hélio Oiticica, Mira Schendel, Lygia Clark, Ubi Bava, Grupo Sigma, Grupo Prometheus, Gego, Francisco Infante-Arena, Carlos Cruz Diez, Vera Molnár entre tantos mestres que revolucionaram a arte do século XX influenciando as futuras gerações.

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José Henrique Fabre Rolim

Jornalista, curador, pesquisador, artista plástico e crítico de arte, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisantos (Universidade Católica de Santos), atuou por 15 anos no jornal A Tribuna de Santos na área das visuais, atualmente é presidente da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), colunista do DCI com matérias publicadas em diversos catálogos de arte e publicações como Módulo, Arte Vetrina (Turim-Itália), Arte em São Paulo, Cadernos de Crítica, Nuevas de España, Revista da APCA e Dasartes.

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