Opinião

Vanguarda russa, uma revolução nas artes

A mostra O Futuro em Construção 1918- 2018 que acontece no Sesc Pompeia resgata a importância do vanguardismo russo nas artes reunindo 300 projetos desenvolvidos entre 1918 e 1930 na escola soviética Vkhutemas, um marco no pensamento estético do século XX promovendo visões conceituais futuristas, suprematistas e construtivas.

A exposição recria projetos de 75 artistas entre designers e arquitetos como Wassili Kandinsky , Kasmir Maliévitch, Vladímir Tátlin, Aleksandr Ródtchenko, Liubóv Popóva, Varvára Stepánova, Ekster, Ladóvski, Miélnikov, El Lissitszki, Zaliésskaia e Komaróva. Uma recriação importante de rico material produzido nas faculdades de ofícios proporcionando uma análise profunda da pedagogia e dos processos criativos de uma escola que revolucionou as artes e o design contemporâneo, uma referência essencial para se compreender a evolução cultural das primeiras décadas do século XX.

A inauguração da universidade Vkhutemas ocorreu em 1918, em Moscou vinculada com a vanguarda estética promovendo uma revolução estrutural nas artes, mas infelizmente, após o seu fechamento pelo totalitarismo de Stalin, alguns de seus mestres se transferiram para a Bauhaus.

As peças expostas foram selecionadas dentre as inúmeras produzidas por grandes mestres como as estruturas físicas e tridimensionais de gesso Arkhiteton, concebidas por Kasmir Maliévitch, o projeto a Cidade Flutuante do arquiteto Guéorgui Krútikov, as peças e roupas desenvolvidas por Liubov Popova e Várvara Stepániva além de magníficos trabalhos de Vassìli Kandinsky, Konstantin Miélnikov e El Lissítzki.

Vkhutemas foi um centro impar nas experimentações e no desenvolvimento de uma arte engajada como instrumento educativo revolucionário, se distanciando dos cânones das belas artes. Visava uma democratização da cultura combater o analfabetismo e impulsionar a emancipação feminina. Deve-se frisar que em pleno anos 20, a universidade Vkhutemas formou cerca de 30 mulheres no curso de arquitetura, sendo que algumas se tornaram famosas como Lidia Kumárova, que concebeu o projeto Komintern, um complexo administrativo arrojadíssimo, tendo como principal prédio uma grandiosa construção espacial com anéis circulares.

Maliévitch foi um dos protagonistas principais na mudança dos rumos da Arte Moderna notadamente com o seu livro “Suprematismo: o mundo como não objetividade”, lançado em 1926, que influenciou as novas gerações de artistas, como no caso dos movimentos concreto e neoconcreto no Brasil.

Anteriormente, em 1913, Maliévitch lança uma série de publicações cubistas expondo obras neoprimitivistas, que denomina Realismo Transracional. A cenografia e o figurino da ópera Vitória sobre o Sol, apresentada no teatro Luna Park de São Petersburgo, foram de sua autoria e determinantes para o desenvolvimento do Suprematismo. No cenário revolucionário entre figurinos de formas cúbicas, floresce pela primeira vez o legendário Quadrado Preto.

A exposição no Sesc Pompéia é extremamente importante por destacar a incrível experiência pedagógica que aconteceu na Rússia entre 1918 e 1930, primeiramente com os Svomas (Ateliês Livres) que ocuparam os espaços das antigas academias imperiais de arte, sendo posteriormente transformadas em uma universidade conhecida com Vhlutemas (Ateliês Superiores de Arte e Técnica) com sede em Moscou. Essa instituição inspirou ainda em pleno anos 20 a concepção do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, estimulando iniciativas e métodos inovadores semeando as futuras incursões da Bauhaus.

Os curadores Celso Lima e Neide Jallageas fizeram uma pesquisa bem profunda e reconstruíram uma série de projetos na área do design, da arquitetura, da tecelagem, da arte gráfica, da cerâmica entre tantos itens revelando aspectos pouco divulgados dessa instituição, que com a ascensão de Stalin foi fechada em 1930 com o intuito de anular a sua importância histórica, destruindo inclusive alguns registros como documentos e desenhos e impondo as regras do Realismo Socialista.

O visitante se defronta com peças de design reconstruídas aqui no Brasil por uma equipe de altíssimo nível, resgatando o arrojo da modernidade russa nos anos 20, propondo parâmetros estéticos vinculados à praticidade dos novos tempos, já apregoados pelo Manifesto Futurista de 1909 de autoria do poeta italiano Filippo Marinetti.

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José Henrique Fabre Rolim

Jornalista, curador, pesquisador, artista plástico e crítico de arte, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisantos (Universidade Católica de Santos), atuou por 15 anos no jornal A Tribuna de Santos na área das visuais, atualmente é presidente da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), colunista do DCI com matérias publicadas em diversos catálogos de arte e publicações como Módulo, Arte Vetrina (Turim-Itália), Arte em São Paulo, Cadernos de Crítica, Nuevas de España, Revista da APCA e Dasartes.

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