A expressão Poética do Pitoresco surge no final do século XVIII e define a categoria estética das obras paisagísticas em que a natureza é de certa forma arrumada para se adaptar aos sentimentos humanos. O termo já tinha sido usado anteriormente pelos italianos para definir o modo de pintar castelos, torres e ruínas clássicas envoltas em jardins idealizados.
Aplicadas no mesmo período, a Poética do Pitoresco difere da Poética do Sublime, a qual remete aos aspectos misteriosos e grandiosos da natureza, desenvolvendo no indivíduo um sentido de temor e solidão.
Na Poética do Pitoresco, segundo Argan (2001, p. 19) “o repertório é o mais variado possível: árvores, troncos caídos, manchas de grama e poças de água, nuvens móveis no céu, choupanas de camponeses, animais no pasto, pequenas figuras.” Esses detalhes, deveriam ser aplicados de forma rápida, sem pretensão de realidade, no entanto, a referência do local deveria ser aplicada, preferencialmente no título, pois assim, de certa forma ampliar-se-ia o turismo da região, um assunto que vinha sendo discutido e “difundido.”
Diferentemente, as duas Poéticas já tinham sido aplicadas em períodos anteriores na História da Arte. A categoria do Pitoresco, por exemplo, foi aplicada pelos holandeses nas paisagens do século XVII e pelos franceses no Classicismo Barroco.
Além de Alexander COZENS (1717-1786), responsável por teorizar a pintura paisagística inglesa do período, e seu filho John Robert COZENS (1752-1797) também pintor de paisagens, os artistas ingleses, John CONSTABLE (1776-1837) e Joseph Mallord William TURNER (1775‑1851) se destacam, entre outros, na pintura paisagística com viés pitoresco e iluminista na passagem dos séculos XVIII para o XIX.
Considerado um dos mais importantes paisagistas ingleses do início do século XIX. Somente em 1799, Constable ingressou na Royal Academy, em Londres, para estudar pintura. Mas, para sua tristeza, só foi eleito membro oficial da academia em 1829, apesar de já ter ganho medalhas de ouro em três exposições em Paris, na França, e de todo ano ter participado das exposições inglesas por cerca de vinte e sete anos em seguida.
Constable aprendeu muito sobre a representação de paisagens com as pinturas de Claude LORRAIN[1] e Nicolas POUSSIN[2] e soube aplicar com maestria a influência pitoresca dos dois artistas.
As exposições parisienses e inglesas lhe trouxeram fama e a venda de grandes produções, algumas delas réplicas. Casado, pai de sete filhos, morador em Hampstead a partir de 1819, Constable passou a estudar, principalmente, durante a primavera e verão, as cores e as nuvens do céu e os reflexos d’água à exaustão, viajando por East Bergholt um vilarejo ao sul de Suffolk, Salisbury do condado de Wiltshire, Arundel e Petworth no West Sussex, para representar e pintar as vistas, alterando-as sempre que necessário afim de as deixar as mais belas possíveis e acolhedoras, apoiado em sua emoção visual.
Para Constable, não existe um espaço universal, dado a priori, na sua estrutura, imutável; seu espaço é composto de coisas (árvores, casas, águas, nuvens), e elas são captadas como manchas coloridas, que o pintor se esforça em representar com imediaticidade, servindo-se de uma técnica rápida e vigorosa. (ARGAN, 2001, p. 40)
A pintura da Catedral de Salisbury, construída entre os séculos XIII e XIV, recebeu de Constable, certamente encantado com a altura da torre, diversas versões com diferentes pontos de vista.
Do lado esquerdo inferior a presença do amigo, John Fisher, bispo de Salisbury, responsável por compartilhar sua obra ao longo da vida.
Ao rejeitar a hierarquia das academias, que desvalorizava a pintura de paisagens por si só, aceitando de bom grado somente as acompanhadas por cenas históricas ou mitológicas, a obra de Constable, repleta de terra cultivada, cursos d’água, jardins, operários, celeiros e pastagens, em meio a amplas paisagens, foi fundamental para a geração romântica do século XIX.
Uma agradável sensação de tranquilidade e harmonia permeia essa paisagem de quase clareza fotográfica.. As grandes áreas de sol brilhante e sombra fresca, a linha divisória da cerca e o belo equilíbrio de árvores, prados e rios são evidências da síntese criativa do artista no local real. A precisão das pinceladas de Constable, vista em animais, pássaros e pessoas, dá importância a esses detalhes menores. Constable era natural de Suffolk, o condado ao norte de Essex. Seu apego profundo e consumidor à paisagem dessa área rural é um fator constante em suas obras. Seus estudos e cadernos de esboços revelam sua completa absorção nos elementos pictóricos de sua terra natal: o movimento de massas de nuvens, a sensação das planícies atravessadas por rios e córregos e o dramático jogo de luz sobre eles. (NATIONAL GALLERY OF ART, Washington, EUA. Tradução nossa[3])
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. Do Iluminismo aos movimentos contemporâneos. Tradução Denise Bottmann; Federico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. 709 p.
NATIONAL GALLERY OF ART, Washington, EUA. Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.74808.html Acesso em: 10 jul. 2020.
NATIONAL GALLERY OF ART, Washington, EUA. Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.1147.html Acesso em: 10 jul. 2020.
THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART, Nova York, EUA. Disponível em: https://www.metmuseum.org/art/collection/search/435922 Acesso em: 10 jul. 2020.
[1] Claude LORRAIN (ca. 1600/5-1682) viveu quase toda a vida ao redor da Campagna, na região do Lácio, em torno de Roma, cuja beleza pastoral inspirava os artistas paisagistas. Saiba mais de Lorrain em https://arteref.com/artigos-academicos/claude-lorrain-classicismo-barroco/
[2] O francês Nicolas POUSSIN (1594-1665) é considerado um dos maiores mestres acadêmicos do século XVII, também, chamado de Classicismo barroco ou estilo Luís XIV. Saiba mais de Poussin em https://arteref.com/artigos-academicos/classicismo-barroco/
[3] A pleasant sense of ease and harmony pervades this landscape of almost photographic clarity. The large areas of brilliant sunshine and cool shade, the rambling line of the fence, and the beautiful balance of trees, meadow, and river are evidence of the artist’s creative synthesis of the actual site. The precision of Constable’s brushwork, seen in the animals, birds, and people, lends importance to these smaller details. Constable was a native of Suffolk, the county just north of Essex. His deep, consuming attachment to the landscape of this rural area is a constant factor in his works. His studies and sketchbooks reveal his complete absorption in the pictorial elements of his native countryside: the movement of cloud masses, the feel of the lowlands crossed by rivers and streams, and the dramatic play of light over all. (National Gallery of Art, Washington, EUA.Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.1147.html Acesso em: 10 jul. 2020.)
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