Os visitantes do “Morar Mais por Menos – Decoração, Design, Arquitetura, Paisagismo”, que abriu as portas dia 5 de novembro, poderão conferir a proposta #chiquecabenobolso, até o dia 6 de dezembro de 2020. Quem comparecer, terá a oportunidade de conhecer trabalhos de artistas contemporâneos como os de Tatiana Mesquitela. Carioca, formada em publicidade, que recentemente conquistou espaço em Portugal, atraindo a atenção de galerias de outros países europeus. Tatiana destaca:
“A minha proposta é a de convidar a sociedade para uma reflexão sobre o que está acontecendo por trás do mundo superficial. Como o mundo físico e o espiritual relacionam-se, como dependem um do outro”.
Luiz Carlos Prestes Filho: Como a arte está contextualizada no evento “Morar Mais por Menos”? As obras tem um papel meramente decorativo?
Tatiana Mesquitela: O evento foi criado no Rio de Janeiro, no ano de 2004, com o propósito: O CHIQUE CABE NO BOLSO. O evento destaca valores como a inclusão social, a reutilização dos materiais e a sustentabilidade. Os profissionais que ocupam o espaço não possuem uma gama extensa de opções para desenvolver seus projetos, eles utilizam materiais que já existentes, dão aos mesmos uma nova identidade.
A arte entra nesse momento, quando é preciso pensar FORA DA CAIXA e ser inventiva. A arte não vem do acaso. As obras expostas não são meramente decorativas. Elas nasceram por conta da interação do mundo interior com o mundo exterior, vieram através do subconsciente. Consigo ver arte em tudo o que é fabricado sem o imediato objetivo artístico.
Algumas das obras expostas representam ambientes no Rio de Janeiro como o Arpoador e o bairro de Copacabana. Os visitantes conseguem sentir a vibração destes lugares, a imagem tem o poder para fazer isso.
Prestes Filho: Quais os temas que você retrata? Como a sua proposta se diferencia dos outros artistas que participam do evento?
Tatiana Mesquitela: Busco retratar temas religiosos, políticos, psicológicos, espirituais e sociais! Um pouco de cada natureza. A minha proposta é a de convidar a sociedade para uma reflexão sobre o que está acontecendo por trás do mundo superficial. Como o mundo físico e o espiritual relacionam-se, como dependem um do outro.
Através de imagens representativas, introduzo o indivíduo na realidade passada. Faço este pensar sobre como a História da humanidade reflete o presente e o futuro. Faço menção a questões ligadas à psicologia, para mim não existe tabu. Entendo que o comportamento de um indivíduo pode influenciar a toda a humanidade de maneira progressiva, afetar culturalmente o mundo. Trazer à tona o que não está tão explicito.
Como dizia o Tunga: “Nós somos cobertos de cascas e representações que construímos de nós mesmos. E normalmente tentamos nos fazer representar por coisas que não são a nossa essência. Por isso, é importante buscar o strip-tease das coisas para ir além daquilo que está representado.”
Prestes Filho: Quais são os trabalhos que você apresenta? Quais são as técnicas utilizadas?
Tatiana Mesquitela: No evento exponho telas e esculturas, em diferentes plataformas. Apresento uma obra bem recente, um Spinner de um avião. Uma das minhas características principais é a de pintar sobre superfícies que oferecem desafio, sem mudar o material que utilizo e a minha técnica.
Trabalho com tinta a óleo, para partes mais realistas, com tinta acrílica e com colagens. O efeito da folha de ouro e o Collorjet atraem minha atenção. A técnica de pintura que uso é a de não ter um rascunho pronto.
Escolho um tema, começo por uma parte maior e a partir dela vou seguindo a mesma linha de pensamento. A música está presente durante todo o processo para me dar horizontes, ver o invisível.
Prestes Filho: Você é formada em publicidade, como migrou para as artes plásticas?
Tatiana Mesquitela: Estudei na faculdade de publicidade, pois era a área com a qual eu mais me identificava profissionalmente. Porém, não era algo que eu sentia grande paixão.
Na minha infância eu passava o dia todo a desenhar e a inventar, gostava de montar os ambientes da casa das minhas bonecas com fita cassete. Nos desenhos feitos com lápis de cor, aplicava colagens. Era algo que me fazia muito bem, mas o tempo passou, eu parei.
Quando no início da vida adulta tive uma fase muito difícil, aconteceu que a minha “válvula de escape” voltou a ser o desenho. Neste momento, veio um despertar espiritual e comecei a ver o mundo em outra dimensão. Entrei num curso de artes plásticas no Rio de Janeiro. Hoje eu concilio o empreendedorismo, para sobreviver, e a arte.
Prestes Filho: Acima você citou o Tunga, quais são suas outras referencias de artistas plásticos brasileiros?
Tatiana Mesquitela: Aprecio a arte contemporânea, acompanho exposições em geral. Muitas vezes percebo em artistas desconhecidos um dom específico que não percebi naqueles mais reconhecidos e valorizados no mercado das artes. Entendo que somos dependentes uns dos outros, pois formamos um só corpo.
Particularmente, admiro o trabalho da Beatriz Milhazes, do Claudio Souza Pinto e do Carlos Araújo. Estamos falando de brasileiros, mas gostaria de destacar o nome de um artista universal, Marcel Duchamps. Ele exerceu grande influencia na minha formação, assim como na formação em muitos colegas.
Ele disse certa vez: “A arte pode ser boa, má ou indiferente mas, qualquer que seja o adjetivo usado devemos chama-la de arte, e uma arte ruim ainda é arte, assim como uma péssima emoção não deixa de ser uma emoção”.
Prestes Filho: O mercado internacional das artes atrai sua atenção? Como foi expor as obras em Portugal?
Tatiana Mesquitela: No meu pouco tempo de carreira, vejo que o mercado das artes tem se aprimorado, inclusive no Brasil. Hoje em dia temos galerias abertas para o contemporâneo, os artistas estão mais organizados, inclusive para enfrentar questões burocráticas e de direitos autorais. Por outro lado, existe uma grande diversidade de linguagens artísticas que o mercado abraça. O incentivo para novos artistas está em alta. Expor minhas obras em Portugal – nas galerias “Le Chat”, ”Calçada Cem”, “Wyze” e na loja de design de interiores “Domo” – foi um privilégio, gostei muito dessa experiência. Aquele país é um destino turístico importante, recebe pessoas do mundo inteiro, com isso, a visibilidade dos meus trabalhos aumentou e muitas portas foram abertas. Também, a temporada em Portugal me permitiu ter acesso a países que foram o berço da História da arte, como a França e a Itália.
Prestes Filho: Quais são seus planos? Quais temas atraem sua atenção?
Tatiana Mesquitela: O que eu sempre gosto de dizer é que não faço muitos planos, mas sempre tenho um objetivo. Eu amo o Brasil, mas pretendo sair da minha zona de conforto e explorar o mercado das artes nos EUA e na Europa. Eu sou uma pessoa muito curiosa e busco aprender sobre temas diversos. A arte surrealista me diz muito sobre o psicológico e o subconsciente e isso me atrai. Os temas sobre nossa realidade atual, tanto política como social, também. Perceber como a visão de um determinado artista sobre um determinado tema influencia os movimentos culturais é algo fascinante. Planejo exposições, principalmente no Brasil.
LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).
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