Nas inquietantes formas de expressão estimuladas pelos avanços tecnológicos, a arte se envolve nas tramas da consciência e da inconsciência, uma dicotomia que elucida percursos e desafios, experiências e confrontos. A arte na sua acepção mais pura é essencial para se compreender a complexidade existencial do ser humano. Todas as manifestações artísticas interagem e se estruturam na sensibilidade humana acoplando a relatividade do tempo e do espaço.
Questões essências são percebidas e colocadas em destaque como a própria manipulação do mercado de arte na área das visuais, que influencia a própria mídia, desvirtuando valores ou glorificando discutíveis expressões artísticas. A história e sobretudo o tempo é implacável, existe uma filtragem natural que coloca os verdadeiros valores no seu devido lugar. O reconhecimento é algo que se conquista e marca a importância de uma carreira artística consolidada nas superações dos obstáculos e no arrojo da criatividade.
Recentemente foi lançado no Anexo Millan (Rua Fradique Coutinho, 1416) o livro Next de Klaus Mitteldorf juntamente com uma mostra de curta duração, reunindo fotografias de pedestres em cidades como Tóquio e Berlim, imagens que ludicamente se sobrepõem em transparências de um tempo, manipulações digitais preciosas que percorrem referencias essenciais como o Manifesto seminal de 1925, Painting, Photography, Film na qual Lászlo Moholy-Nagy dizia que a fotografia era mais um meio de criação do que um processo mecânico de registro. Outras referências são percebidas como as experiências de Eadweard Muybridge, do futurismo de Giacomo Balla e dos irmãos Anton Giulio e Arturo Bragaglia, das fotomontagens dadaístas, enfim, tantas experimentações que são acopladas na vivencia de Klaus, chegando até atingir uma vibração cromática de um Francis Bacon.
O livro Next reúne 49 fotografias, numa primorosa edição da Damiani Editore de Bologna (Itália), são 99 páginas de imagens que captam um movimento congelado e primoroso no resultado plástico final.
Anteriormente mais precisamente em 2013, Klaus abria a mostra Work na FAAP cobrindo os 30 anos de sua carreira, reunindo 300 fotos com o lançamento de um belíssimo livro editado pela Damiani, reproduzindo todas as obras expostas, um registro de altíssima qualidade focalizando fases marcantes.
A sua paixão pela fotografia começou bem cedo, aos 12 anos com uma câmera Yashica, tendo sido um dos pioneiros do surfe no litoral brasileiro, tema aliás de um documentário.
O uso das cores na sua obra é predominante, um visual extremamente pop que chega a dialogar com mestres da fotografia do começo do século XX como Lartigue.
Utilizando vários artifícios para conseguir os efeitos da deformação fotográfica, como lentes, lupas, óculos entre tantos recursos, acaba penetrando na intimidade das pessoas retratadas descobrindo a sua própria identidade, uma projeção do seu próprio ego.
A distorção e a saturação cromática se aliam em certo sentido com o modernismo brasileiro captando a alma tropical da nossa cultura na exuberância da natureza e do cotidiano das cidades.
Curioso notar que o fotógrafo tem dois lados bem significativos, um entrosado na Bauhaus, bem organizado e outro vinculado a uma anarquia bem tropical.
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