Artigos Acadêmicos

Os artistas da Alemanha no início do século XVI


Na Alemanha, berço da Reforma, o início do século XVI parece ter despertado os artistas para as reformas também do ponto de vista artístico quando se depararam com as obras produzidas na Itália.

De acordo com Gombrich (2000) foram duas as maiores realizações na pintura pelos mestres italianos, que despertaram a curiosidade dos artistas da Alemanha: uma foi a descoberta da perspectiva, a segunda o conhecimento da anatomia, que os levou a representação perfeita do corpo humano.

Artistas com as mais diferentes personalidades como Matthias GRÜNEWALD (1470-1528); Albrecht DÜRER (1471-1528); Hans HOLBEIN, o jovem (1497-1543) e Lucas CRANACH, o velho (1472-1553) se destacaram com uma série de realizações, no curto espaço de tempo denominado de Renascimento Pleno.

Da Vinci e o Renascimento Pleno ou Alta Renascença

Michelangelo: um gênio da escultura no Renascimento Pleno

Rafael: a perfeição no Renascimento Pleno


Hans HOLBEIN, o jovem (1497-1543)

Nascido em Augsburgo, Holbein partiu para a Suíça aos dezoito anos, estabelecendo-se em Basileia, onde trabalhou arduamente nas oficinas, produzindo desenhos para as gravuras em madeira e pinturas de retratos. Por volta de 1523/24, Holbein foi para a França e dois anos depois para a Inglaterra, à serviço da corte de Henrique VIII (1491-1547), onde ganhou “fama internacional e moldou o gosto inglês em matéria de retratos aristocráticos”. (JANSON, 1992, p. 492)

Hans HOLBEIN, o jovem (1497-1543) Sir Brian Tuke, ca. 1527/1528 ou ca. 1532/1534. Óleo sobre painel, 49.1×38.5. National Gallery of Art,Washington, EUA.

Hans HOLBEIN, o jovem (1497-1543) Retrato de Sir Brian Tuke, ca. 1537. Óleo sobre madeira, 49×38. Bayerische Staatsgemäldesammlungen. Alte Pinakothek, Munique, Alemanha.

Sob o regime e força política de Henrique VIII, Sir Brian Tuke foi nomeado, em 1528, Tesoureiro e Secretário da casa real cargo que ocupou até sua morte em 1545. Ele também era admirado como um orador eloquente e figura literária

O primeiro retrato, à esquerda, mostra Tuke na idade de 57 e exemplifica as qualidades mais elogiadas no trabalho de Holbein: precisa observação imparcial e exato retrato. O sorriso fraco e o olhar melancólico aparecem nas duas fases da vida.

O retrato à direita apresenta uma caveira2, símbolo da transitoriedade da vida. A caveira parece se divertir ao lembrar que a morte iguala a todos e está chegando também para o nobre Sir Brian Tuke.


Albrecht DÜRER (1471-1528)

Nascido em Nuremberg, na Alemanha, o jovem Albrecht Dürer já mostrava o talento no desenho junto às oficinas de gravuras onde trabalhou como aprendiz. Ao longo de sua jornada passou pela Suíça, centro de comércio de livros humanistas, produzindo uma série de xilogravuras.

Atraído pela arte italiana, Dürer chega a Veneza encantado pela arte de Andrea MANTEGNA (1430/5-1506), a qual, incansavelmente, estuda e faz cópia, e quando regressa a Nuremberg já tem em mente uma “nova concepção do Mundo e do lugar que nele cabe ao artista.” (JANSON, 1992, p. 479)

As pinturas, as aquarelas, as xilogravuras e calcogravuras3, entre outras tantas técnicas experimentadas foram suportes para Dürer aplicar todo conhecimento técnico adquirido por anos, nos mais diversos assuntos.

Albrecht DÜRER (1471-1528) São Jerônimo4 em sua cela conventual, 1514. Calcogravura. Gravura sobre papel, 24,4×18,7. Bartsch 60. Rijksmuseum, Amsterdam, Holanda.

Na gravura São Jerônimo em sua cela conventual, Dürer representa o santo, humildemente, sentado a escrever.

Sobre a imensa mesa de trabalho: o suporte com plano inclinado para leitura e escrita, o tinteiro e a delicada imagem de Cristo crucificado.

A iluminação suave ultrapassa as janelas derramando-se pelo interior do ambiente, elegantemente decorado. Almofadas se espalham ao seu redor, onde confortavelmente sentam-se as pessoas que o procuram.

O ambiente é repleto de simbologias: a cabaça suspensa nas vigas de madeira do teto, a parede ao fundo, que guarda o chapéu de cardeal, o crânio que repousa sobre o peitoril da janela e no primeiro plano as figuras do cão e do enorme leão5, que toma conta do lugar, sob o olhar sonolento e felino.

Albrecht DÜRER (1471-1528) Os Quatro Apóstolos, 1526. Óleo sobre painel, 212,4 x 76,3. Bayerische Staatsgemäldesammlungen. Alte Pinakothek, Munique, Alemanha.

Dürer representa os quatro apóstolos mais importantes na doutrina protestante: João e Paulo no primeiro plano e Pedro e Marcos no plano de fundo.

A solidez e a dimensão dos Quatro Apóstolos evocam o estilo de dois grandes artistas: MASACCIO (1401-1428/9) e Piero DELLA FRANCESCA (1416/17-1492) e não é coincidência, pois Dürer “dedicou boa parte dos seus últimos anos à teoria da arte, redigindo um tratado de geometria, a partir de uma análise profunda do trabalho de Piero della Francesca sobre a perspectiva.” (JANSON, 1992, p. 400)


Veja também


Referências

BAYERISCHE STAATSGEMÄLDESAMMLUNGEN. ALTE PINAKOTHEK, Munique, Alemanha. Disponível em: https://www.sammlung.pinakothek.de/en/artist/albrecht-duerer/vier-apostel-hll-markus-und-paulusAcesso em: 20 ago. 2019.

BAYERISCHE STAATSGEMÄLDESAMMLUNGEN. ALTE PINAKOTHEK, Munique, Alemanha.Disponível em:https://www.sammlung.pinakothek.de/en/artist/albrecht-duerer/vier-apostel-hll-johannes-ev-und-petrus Acesso em: 20 ago. 2019.

BAYERISCHE STAATSGEMÄLDESAMMLUNGEN. ALTE PINAKOTHEK, Munique, Alemanha.Disponível em: https://www.sammlung.pinakothek.de/en/bookmark/artwork/9pL3NlKxeb Acesso em 21 ago. 2019.

GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 2000. 714 p.

JANSON H. W. História da Arte. Tradução J.A. Ferreira de Almeida; Maria Manuela Rocheta Santos. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992. 823 p.

MARTINI, Fátima R. S. A Pintura Renascentista e Maneirista nos Museus. In Curso de Extensão/UNIMES virtual. Santos/SP: UNIMES, 2016. 57 p.

NATIONAL GALLERY OF ART,Washington, EUA. Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.72.html Acesso em 21 ago. 2019.

RIJKSMUSEUM,Amsterdam, Holanda.Disponível em:http://hdl.handle.net/10934/RM0001.COLLECT.33166 Acesso em: 20 ago. 2019.

RIJKSMUSEUM,Amsterdam, Holanda.Disponível em: http://hdl.handle.net/10934/RM0001.COLLECT.33400 Acesso em: 20 ago. 2019.


1 Entre 1802 e 1821, Johann Adam Bernhard von Bartsch (1757-1821) publicou, em francês, vinte e um volumes com o título: Le Peintre Graveur. A obra de Bartsch foi reimpressa diversas vezes. Parte das gravuras foram republicadas no século XX, como parte do livro ilustrado, The Illustrated Bartsch, lançado em New York, pela Abaris Books, em 1978. Bartsch é responsável por desenvolver o sistema de numeração definitiva, com seu próprio nome seguido de um número.

2 Crânios e caveiras fazem parte da iconografia do Renascimento nos séculos XVI e XVII, associados às pinturas de gênero e natureza-morta, principalmente na Alemanha e Países Baixos. Na História da Arte o emprego de caveiras recebe o nome em latim de Vanitas, interpretada como brevidade da vaidade. Frutas apodrecidas, fumaça, relógios, flores colhidas e instrumentos musicais, presentes nas naturezas-mortas, algumas vezes, são considerados Vanitas, mas falta consenso na interpretação.

3 Processo de gravura executada sobre uma matriz de metal. A calcogravura ou calcografia é uma das técnicas mais antigas, compartilhada pela ourivesaria também. Na Renascença utilizava-se, em princípio, o cobre como matriz e as ferramentas podiam ser ponta seca ou buril ou ainda a técnica da água-forte, entre outras.

4 Sacerdote, teólogo e historiador, Jerônimo é considerado pela Igreja Católica, um confessor e doutor da Igreja. Erudito humanista, poliglota e profundo conhecedor das línguas semíticas, em especial o Hebraico, o aramaico e o grego, responsável pela tradução da Bíblia para o latim, Jerônimo viveu por muitos anos em Roma, circulou por diferentes lugares no Oriente, lendo e escrevendo. Por volta de 388, Jerônimo viajou para a Terra Santa, aumentou sua biblioteca e viveu o resto da vida numa espécie de cela onde produziu uma extensa obra literária.

5 O leão na companhia de Jerônimo pode ter dois significados: dizem que ele estava recluso na caverna com mais alguns monges, quando surgiu um leão com a pata ferida. Todos fugiram, menos São Jerônimo, que verificou que sua pata estava cheia de espinhos. Com carinho o santo ganhou a confiança do felino, curando-lhe as feridas. Dessa forma o leão passou a lhe fazer companhia e nunca mais se afastou. O segundo é a própria simbologia do animal ligado à Jesus Cristo, pela majestade e força.

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Fatima Sans Martini

Mestre em Artes Visuais com Abordagens Teóricas, Históricas e Culturais pela UNESP. Pós-graduação em História da Arte pela FAAP-SP. Formada em Artes Plásticas. Experiência profissional: Projetista em Design de Interiores. Experiência acadêmica: nas disciplinas de Projetos, Desenho, História do Mobiliário e História da Arte nos cursos de Arquitetura e Design de Interiores. Professor das disciplinas de Estética e História da Arte Mundial e Brasileira no Curso de Artes da Unimes, Universidade Metropolitana de Santos, SP

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