Curiosidades

Como Mondrian se tornou abstrato



Um dos artistas abstratos mais conhecidos do século XX é Piet Mondrian, e seu caminho para a abstração teve influência das obras de Picasso e do cubismo. Suas pinturas abstratas que compõem as paredes dos museus em todo o mundo e tornaram-se ícones da arte moderna de maneira única, ainda não é claro para a maioria das pessoas como ele chegou a este estilo tão característico.

Durante o início do século XX, muitos artistas reconheceram a influência de Pablo Picasso e do cubismo – e se não reconheceram, provavelmente estavam mentindo. Estes artistas além das pinturas também relacionavam caracteristicamente de seus trabalhos com a religião e filosofia as quais promoviam a simplificação, que só não dominaram completamente suas obras devido ao domínio das leituras formal da história da arte.


Biografia e percurso artístico de Mondrian

Nascido na Holanda em 1872, os trabalhos iniciais de Mondrian centraram-se em pinturas de natureza, se inspiravam no Fauvismo e no iluminismo. Mondrian logo foi influenciado pelo trabalho  de Vincent Van Gogh.

Se olharmos as obras de Mondrian entre 1908 e 1909, particularmente a Árvore Vermelha (1908), é fácil perceber as características que comumente se atribui à obra de Van Gogh, como pinceladas fortes, a colocação da árvore dentro da composição, o uso de cores brilhantes e a fusão da árvore na paisagem.

Piet Mondrian | Red Tree, 1908.

O ano de 1911 foi um ano crucial para Mondrian, indiscutivelmente o mais importante de sua carreira. Foi quando ele viu a exposição “Moderne Kunstkring” no Museu Stedelijk, que incluía obras de Paul Cézanne, Picasso e Georges Braque que trouxeram o cubismo para a Holanda.

Este evento mudou drasticamente a ideia de que tipo de pintor ele queria ser. A exposição fez também fez com que ele mudasse de ideia sobre onde ele queria morar. Terminou saindo da Holanda e indo para Paris no mesmo ano.

Em Paris, o trabalho de Mondrian rapidamente assumiu características cubistas. Inicialmente, suas pinturas ecoaram o chamado estilo analítico do cubismo, na sua paleta de beges, cinzas e ocres, bem como o uso de linhas retas e arcos para indicar objetos e espaço.

Quanto Picasso e Braque caracteristicamente criavam retratos ou naturezas mortas, o assunto de Mondrian era a natureza, realizado através de uma rede sistemática de ângulos e grades direitas. Além disso, seu uso do espaço era muito mais bidimensional e menos ambíguo do que o usado no cubismo.

Piet Mondrian | Composition with Grid 8 – Checker board Composition with Dark Colours, 1919.

A arte abstrata

O que motivou Mondrian para a arte abstrata era algo muito mais místico que o de Picasso e Braque. Em suas palavras, ele queria “articular uma concepção mística de harmonia cósmica que se esconderia na superfície da realidade”.

Seu pensamento baseou-se na sua crença na Teosofia, uma filosofia que ganhou um seguimento nos Estados Unidos no final dos anos 1800. Uma maneira como suas crenças se manifestavam em suas obras era através de eixos horizontais e verticais.

Tais cruzamentos refletiram a crença de Mondrian de que o universo era o anfitrião de um conflito constante entre as forças opostas, quer fossem dicotomias do bem e do mal, positivas e negativas, masculinas e femininas, ou dinâmicas e estáticas.

Piet Mondrian | Composition with Large Red Plane, Yellow, Black, Grey and Blue, 1921

Em 1914, Mondrian foi visitar seu pai doente na Holanda e então, devido ao início da Primeira Guerra Mundial, não poderia voltar para Paris. Ele não retornaria até 1919. Mas na Holanda, Mondrian se esforçou metodicamente para destilar seu estilo de pintura, e foi durante esse tempo que os eixos horizontais e verticais mencionados emergiram como os principais pontos organizadores de suas imagens cada vez mais.

A partir de 1916, Mondrian começou a focar inteiramente a favor do que ele sentiu cada vez mais ser a estrutura irredutível do mundo: uma grade de linhas perfeitamente paralelas e perpendiculares, composta por seus cruzamentos, agora conectados. No início, essas grades se estendiam de maneira uniforme através da tela e eram combinadas com cores, como rosa, azul e laranja.

Eventualmente, as redes de Mondrian incluíam quadrados maiores e retângulos de diferentes tamanhos e sua paleta foi reduzida a cores primárias. O início desta abordagem pode ser rastreado desde 1920, e é nesse ponto que Mondrian começou a fazer as obras que se tornaram sinônimas com o nome dele.

Mondrian | Composition with Red, Yellow and Blue, 1927

Foi também durante esse tempo que Mondrian começou a escrever sobre seu trabalho. Em um de seus ensaios mais importantes, “Neo-Plasticism in Pictorial Art” (1917-18), ele explicou sua abordagem à abstração. Entre outras coisas, ele citou a automação da vida como o ímpeto que levou tantos artistas à abstração – o que ele argumentou estava motivado internamente, pois considerava a arte abstrata como uma representação da mente humana.

Mondrian também propôs que a beleza se baseasse em uma relação entre complementaridade: forças equilibradas e equivalentes que ele acreditava serem a mais pura representação da universalidade, da harmonia e unidade que são características inerentes da mente e da vida e de qualquer coisa.

Pictoricamente para Mondrian, isso assumiu a forma das duas linhas que criam um ângulo reto, o que ele pensou expressar, em perfeita harmonia, a relação entre dois extremos. Além disso, Mondrian acreditava que o uso de cores e tamanhos complementares reforçava esse equilíbrio.

Obra artística criada por Mondrian no início do século XX. (imagem extraída de Atelier)

A história do surgimento de Mondrian como um artista abstrato é apenas uma das muitas narrativas que são tão integrantes da história da arte do século XX.

Muitas vezes são narrativas extremamente satisfatórias para compartilhar por conta da lógica de sua progressão artística. Ao mesmo tempo, a arte moderna e contemporânea oferece uma série infinita de histórias do processo ou “maturação” de um artista. Essas narrativas podem ser complexas e não hierárquicas mas também nos oferecem muitas novas maneiras de pensar sobre o ato da criação.


Fontes:

Artsy, Wikicommons, Wikipedia, The Metropolitan museum


Veja também

https://arteref.com/arte/paul-cezanne-era-o-unico-mestre-de-picasso-saiba-o-porque/

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Paulo Varella

Estudou cinema na NFTS (UK), administração na FGV e química na USP. Trabalhou com fotografia, cinema autoral e publicitário em Londres nos anos 90 e no Brasil nos anos seguintes. Sua formação lhe conferiu entre muitas qualidades, uma expertise em estética da imagem, habilidade na administração de conteúdo, pessoas e conhecimento profundo sobre materiais. Por muito tempo Paulo participou do cenário da produção artística em Londres, Paris e Hamburgo de onde veio a inspiração para iniciar o Arteref no Brasil. Paulo dirigiu 3 galerias de arte e hoje se dedica a ajudar artistas, galeristas e colecionadores a melhorarem o acesso no mercado internacional.

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