A chamada Escola de Fontainebleau ocorreu por volta de meados até o final do século XVI, tendo como centro o Chateau de Fontainebleau1, na França, dividindo-se em dois períodos artísticos.
O primeiro movimento envolveu os seguintes artistas: Giovan Battista do Jacopo, conhecido por ROSSO FIORENTINO2, (1494-1540), chamado em 1531 por Francisco I para ajudar na reforma do Chateau; Francesco PRIMATICCIO (1504-1570), Niccolò dell’Abbate, também conhecido como NICOLINO (1509/1512-1571) Léonard THIRY (1490-1550), Luca PENNI (1500-1557), Antoine CARON (1521-1599), François CLOUET (ca. 1510-1572) e Benvenuto CELLINI (1500-1571)
O maneirismo das cortes, de acordo com Hauser (2000) é, principalmente na sua última fase, um movimento europeu uniforme e universal, cuja fonte é o absolutismo e as cortes intelectualmente e artisticamente interessadas.
A Escola de Fontainebleau também se refere à decoração de interiores, a qual combinou a pintura animada pela composição serpentinata3, o trompe l’oeil4, as delicadas esculturas, entre ornamentos intricados e, principalmente, o estuque ricamente esculpido utilizado junto aos afrescos e às bordas de medalhões. Essas molduras formadas por máscaras, sátiros, putti5, guirlandas de flores e frutas enquadravam, quase sempre, pinturas alegóricas e mitológicas, valorizando-as no jogo de sombra e luz.
Esse estilo decorativo se espalhou por toda França em meados do século XVI, expandindo-se para a marcenaria, ourivesaria, tapeçaria e vidreiros por meio de cópias6 em gravuras executadas, na maioria, pelos próprios artistas. Com o tempo alguns gravuristas se especializaram na reprodução desses desenhos, como os franceses René BOYVIN (ca. 1525-1598 ou1625/6) e Pierre MILAN (ativo em 1537-40).
Na França bem ao gosto Maneirista, os ideais da beleza feminina e a nudez elegante e provocativa foram amplamente representados na pintura. As pequenas e graciosas cabeças, o pescoço e peitos delicados, em gravuras refinadas e detalhadas marcaram a Escola de Fontainebleau e circularam em outros centros do Norte da Europa, influenciando particularmente, os Países Baixos e Alemanha.
A partir de 1594, novos artistas foram chamados para reformar o Chateau durante o reinado de Henrique IV (1553-1610) e na Regência de Maria de Médici (1575-1642)
As atividades artísticas da segunda Escola de Fontainebleau alcançaram a decoração de outros palácios, tais como no primeiro período e também se basearam na pintura Maneirista, embora que tardia, com motivos clássicos e cenas mitológicas.
Entre os artistas, os mais conhecidos foram: Ambroise DUBOIS (1542-1614), Martin FRÉMINET (1567-1619) e Toussaint DUBREUIL (ca.1561-1602), que executou obras com figuras alongadas, nus eróticos e cenas repletas de figuras.
Pintor, arquiteto e escultor do Maneirismo italiano, Francesco Primaticcio juntou-se a Rosso Fiorentino na decoração do Chateau de Fontainebleau em 1532.
Após a morte prematura do colega em 1540, Primaticcio tornou-se responsável pelas obras e pelos demais artistas que lá foram chegando.
De acordo com Janson (1992) Primaticcio recebeu o encargo da decoração de algumas das salas principais do castelo real de Fontainebleau, onde combinou cenas e personagens mitológicos, ilustrando as virtudes do rei no interior de molduras de estuque ricamente esculpidas.
As paredes de palácio receberam o brasão das armas da França e o emblema do rei – a salamandra8.
Os jardins de Fontainebleau receberam inúmeras obras executadas a partir de moldes obtidos de esculturas clássicas provenientes de Roma, sob os cuidados de Primaticcio e seu colega Niccolò dell’Abbate.
Além do rei Francisco I, Primaticcio serviu as cortes dos herdeiros franceses: Henrique II (1519-1559) e Francisco II (1544-1560).
A composição Maneirista agrupa da esquerda para a direita os deuses10: Hades, Poseidon, Atena e Apolo, com seus respectivos símbolos, no interior de uma moldura oval.
Sentados sobre uma nuvem, capas de cetim encobrem a nudez total.
A obra faz parte da série de oito composições desenhadas por Primaticcio para o teto da Galeria Ulysses, destruído por volta de 1738-1739, no interior do Chateau de Fontainebleau.
As torções, músculos acentuados e membros alongados fazem parte do estilo Maneirista de Primaticcio.
Considerado um dos maiores pintores e desenhistas de cenas históricas e mitológicas do período Maneirista francês, François Clouet, sucedeu seu pai, Jean CLOUET11, em 1541, na corte francesa de Francisco I, desempenhando papel importante nas reproduções de nus em interiores e em amplas paisagens, as quais refletem seu trabalho junto ao mestre Primaticcio e à primeira Escola de Fontainebleau.
O sexagenário artista teve a oportunidade de conviver além do reinado de Francisco I, com as cortes francesas de Henrique II, Francisco II e Charles IX (1550-1574).
A cortina de damasco e brocado vermelha se abre para a dama em seu banho. Clouet representa a jovem mulher nua, sentada dentro de uma banheira. Sobre a bacia, um delicado pano branco conserva o calor da água. A mão direita segura um pequeno galhinho de flor, enquanto a outra mão ao recolher a seda branca, deixa entrever o nome de François Ianetti, gravado na borda dourada da bacia.
Um tabuleiro forrado com toalha branca de linho sobre a banheira apoia um cesto de frutas. Atrás da jovem surge um garoto pronto a alcançar o cacho de uvas sob o olhar da ama de leite. Ao fundo, no ambiente requintado, as chamas ardem na lareira, enquanto a serviçal maneja o cântaro dourado com água quente para o banho da senhora.
As frutas, as sedas e as joias são elementos flamengos e italianos, entranhados na arte francesa do século XVI.
Identificada como amante real, a bela feição aristocrática da mulher recebeu ao longo do tempo diferentes identificações, desde Diana de Poitiers, amante do rei Henrique II, até Maria Stuart12. Existem outras pinturas de Clouet em que ele de fato, segundo alguns, introduz as duas mulheres como deusas na composição possivelmente histórica13.
O fato é que a textura e formosura da jovem de seios pequenos e a testa alta, com cabelos presos e adornados com pérolas fazem parte do estilo de François Clouet junto às obras maneiristas e à moda feminina do período.
CLEVELAND MUSEUM OF ART, Cleveland, EUA. Disponível em http://www.clevelandart.org/art/1929.537 Acesso em 02 set. 2019.
HAUSER, Arnold. História Social da Arte e da Literatura. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 1032 p.
JANSON H. W. História da Arte. Tradução J.A. Ferreira de Almeida; Maria Manuela Rocheta Santos. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992. 823 p.
MUSÉE DES BEAUX ARTS, Tours, França. Disponível em: http://www.mba.tours.fr/88-14-16e.htm Acesso em: 30 ago. 2019.
MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO, São Paulo, Brasil.Disponível em: https://masp.org.br/acervo/obra/o-banho-de-diana Acesso em: 30 ago. 2019.
NATIONAL GALLERY OF ART,Washington, EUA. Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.46112.html Acesso em: 30 ago. 2019.
NATIONAL GALLERY OF ART, Washington, EUA. Disponível em: https://www.nga.gov/collection/art-object-page.137881.html Acesso em: 10 set. 2019.
THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART, Nova York, EUA. Disponível em: https://www.metmuseum.org/art/collection/search/397750 Acesso em: 30 ago. 2019.
THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART, Nova York, EUA. Disponível em: https://www.metmuseum.org/art/collection/search/358361 Acesso em: 30 ago. 2019.
1 O Palácio Real de Fontainebleau é um dos maiores palácios franceses. Localizado no Norte da França, o palácio reflete o trabalho de vários monarcas franceses, construído a partir da estrutura inicial e da decoração de interior durante o reinado de Francisco I (1494-1547) grande patrocinador dos artistas maneiristas junto à corte francesa no século XVI.
2 O florentino e excêntrico Giovan Battista do Jacopo, conhecido por ROSSO FIORENTINO, (1494-1540) foi aprendiz de Andrea DEL SARTO (1486-1530) e PONTORNO (1494-1557) dois dos responsáveis por fazer a transição do Renascimento tardio para o Maneirismo na Itália.
3 Expressão italiana para a figura em forma de serpente, a figura serpentinata se tornou um elemento comum na representação de composições entrelaçadas e contorcidas no Maneirismo.
4 Expresão francesa para enganar os olhos, a técnica artística chamada de Trompe l’oeil transforma a imagem em três dimensões, ocasionando um ilusionismo espacial. A expressão é usada tanto na pintura como na Arquitetura.
5 Meninos alados, chamados de putti pelos italianos. No singular, o garoto alado é chamado de putto.
6 É provável que tenha sido instalada uma oficina de gravura direcionada para a reprodução dos desenhos e pinturas executadas no interior do Chateau de Fontainebleau. Com a morte de Francisco I cessou o financiamento, a escola foi fechada e os artistas voltaram para seus países de origem.
7 Acadêmico, historiador e colecionador de gravuras francesas, Alexandre Pierre François Robert-Dumesnil (1778-1864) continuou o trabalho de Johann Adam Bernhard von Bartsch (1757-1821), publicando em 1835 um catálogo analítico sobre estampas de artistas franceses: Le peintre-graveur français ou Catalogue raisonné des estampes gravées par les peintres et les dessinateurs de l’École française.
8 Símbolo real de Francisco I, a salamandra é capaz de viver na terra e na água, além de poder sobreviver ao fogo. Tanto o Chateau de Fontainebleau como o castelo de Chambord em Loir-et-Cher, na França, receberam a figura do animal nas paredes e frontões de portas.
9 Nascido em Mântua, na Itália, Giorgio GHISI (ca. 1520-1582) foi responsável por montar uma oficina de gravura frequentada por muitos artistas maneiristas, entre eles Diana SCULTORI (ca.1535-ca.1588), chamada erroneamente de Diana Ghisi. A imensa quantidade de gravuras produzidas por ele e alguns dos alunos são cópias de obras de arte de outros artistas, uma prática comum no período.
10 Os deuses gregos são chamados pelos romanos consecutivamente de Apolo, Netuno, Plutão e Minerva.
11 Retratista, desenhista e miniaturista flamengo, Jean CLOUET (1480-1541) também é chamado de Jehan. Sua obra mais conhecida é o retrato do Imperador Francisco I, executado por volta de 1525, no acervo do Musée du Louvre, Paris, França.
12 Uma das mais famosas rainhas do século XVI, educada na corte francesa de Henrique II, a bela Maria Stuart (1542-1587) foi escolhida para futura esposa do príncipe Francisco. Seu casamento foi realizado em 1558, unindo a Escócia e a França. Com a morte de Francisco II em 1560, Maria Stuart voltou para a Escócia.
13 François CLOUET (ca. 1510-1572) O Banho de Diana, 1550/59. Óleo sobre madeira, 136×197. Musée des Beaux-Arts, Rouen, França. Clouet representa, nessa versão, o episódio mitológico de Diana e Acteon, mas confere, por outro lado, uma provável narrativa histórica que aborda a morte do rei francês Henrique II e o casamento de Maria Stuart com o sucessor, o Delfim, Francisco II (1544-1560). Apoiadas na obra, existem outras versões, com pequenas variações. Uma delas pertence ao acervo do Museu de Arte de São Paulo e a outra está no Musée des Beaux Arts de Tours, na França.
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